Crítica | Jojo Rabbit (2019)

Nota do Filme:

As sátiras são uma ótima maneira de se fazer críticas ácidas sobre assuntos sérios, utilizando-se do humor para provocar a reflexão necessária a quem se dispõe a prestar atenção. Grandes obras do cinema, tais como O Grande Ditador (1940) ou Beleza Americana (1999), se consolidaram como tal por saber utilizar essa ferramenta e, assim, instigar emoções ou pensamentos.

Alemanha, durante a Segunda Guerra Mundial. Jojo (Roman Griffin Davis) é um jovem nazista de 10 anos, que trata Adolf Hitler (Taika Waititi) como um amigo próximo, em sua imaginação. Seu maior sonho é participar da Juventude Hitlerista, um grupo pró-nazista composto por outras pessoas que concordam com os seus ideais. Um dia, Jojo descobre que sua mãe (Scarlett Johansson) está escondendo uma judia (Thomasin McKenzie) no sótão de casa. Depois de várias tentativas frustradas para expulsá-la, o jovem rebelde começa a desenvolver empatia pela nova hóspede.

Taika Waititi (Thor: Ragnarok) escreveu, atuou e dirigiu JoJo Rabbit, e, desde o início da narrativa, ele deixa escrachada a sátira com a abertura reproduzindo uma versão de I Wanna Hold Your Hand nazista. Ainda, o diretor conquista a audiência imediatamente com a fusão do cinismo e a inocência das crianças em relação a banalização dos símbolos nazistas, o que cria o humor e a perplexidade.

Desse modo, o roteiro possui diversas camadas além da comédia, pois, apesar de fazer piada com tudo que seja possível envolvendo os dogmas nazistas, ele captura o contexto alemão da época e estabelece os personagens como símbolos disso. Por exemplo, ele compacta o macro, sobre a questão dos extermínios de judeus e todo o estigma cunhado pela Alemanha sobre esse povo, e transfere isso para o micro, com o conflito entre a crença nazista e humanidade do protagonista em relação à judia refugiada, porém com o trunfo da inocência da criança sendo aplicada por não saber identificar os motivos dessa perseguição.

Ainda, em relação ao simbolismo dos personagens, por exemplo, a judia interpretada por Thomasin McKenzie encarna todo o medo irracional pelos judeus como uma espécie de irmã mais velha pra Jojo, ou Yorki (Archie Yates), o amigo do protagonista, é uma espécie de retrato do soldado alemão, representando o poder militar da Alemanha, ou a decadência dele.

Contudo, talvez a personagem mais importante para a narrativa é Rosie, interpretada magistralmente por Scarlett Johansson. Ela está fantástica como a mãe do protagonista pois ela possui 3 facetas diferentes: a de mãe amorosa que apoia o filho; a submissa ao regime que reconhece o quão ruim é, ratificada pela própria trama; e como salvadora de refugiados, como forma de retratar a resistência, servindo inclusive como uma espécie de figura materna para a judia.

Além disso, sua atuação cresce quando interage com o protagonista e a garota judia, pois, conforme dito anteriormente, ao servir de figura materna, Scarlett se destaca nesses momentos mais íntimos, em que, apesar dos horrores da guerra, um abraço caloroso ou palavras amorosas podem ser o necessário para salvar a sanidade de alguém. Inclusive, a personagem é tão importante na narrativa que sempre aparece com algo vermelho para evidenciar a sua dominância em toda a cena.

No mais, a sua atuação é potencializada por conta da direção que Taika Waititi adota, pois, ao banalizar a narrativa ao máximo, o longa atinge picos de drama, como uma espécie de efeito catártico, pelo motivo do diretor conseguir transitar entre os gêneros de forma magistral, além de abusar de recursos como o slowmotion para intensificar a sátira, o que contribui para criar emoções ao sair da comédia.

Ademais, a fotografia faz um interessante uso de cores, principalmente em relação do verde com Jojo, evidenciando sua imaturidade face a todo contexto da guerra. Ainda, a trilha sonora contribui para criar a atmosfera do sarcasmo, colocando desde The Beatles citado no início do texto até David Bowie, com características para exaltar algo similar a glória de morrer em combate, ser herói, etc.

Sendo assim, Jojo Rabbit é um dos ótimos filmes de 2019, que conta com uma performance digna de prêmios para Scarlett Johansson, além de ser uma obra atual, que faz piada com um movimento inventado há mais de 70 anos, que ao invés de estar em voga atualmente deveria ter ficado no passado, ou melhor, nunca ter existido.