Crítica | O Caso de Richard Jewell (Richard Jewell) [2019]

Nota do filme:

“Há uma bomba no Centennial Park. Vocês têm trinta minutos.”

Terrorista

O Caso de Richard Jewell acompanha o personagem título (Paul Walter Hauser), um homem simples que tem como sonho ser parte efetiva da força policial e, até lá, aceita empregos como segurança privado em campus universitário e, eventualmente, nas Olimpíadas de Atlanta de 1996, momento no qual, graças à sua intervenção, uma bomba deixada no local vitima um número muito menor de pessoas do que poderia. Contudo, a despeito de sua participação heróica no evento, vê-se como principal alvo da investigação do FBI, fazendo com que questione a sua tão enraizada crença na autoridade policial.

Clint Eastwood assume a direção em um subgênero com o qual certamente tem intimidade. O mito do herói americano transformado em vilão por uma mídia gananciosa e oficiais da lei com inclinações à violar direitos dos investigados é uma temática já trabalhada pelo diretor em filmes como Crime Verdadeiro (1999), Sobre Meninos e Lobos (2003) e, mais recentemente, Sully: O Herói do Rio Hudson (2016)..

O Caso de Richard Jewell tem uma proposta extremamente simples, motivo pelo qual consegue ser bem sucedido com tão pouco esforço. Abusando de arquétipos já conhecidos, a obra traça a narrativa tradicional, aproveitando-se de uma pertinente crítica ao modelo midiático de acompanhamento de casos criminais. Há clichês? Sem dúvidas, mas Eastwood é o tipo de diretor que sabe trabalhar com eles, de modo que, por mais que a audiência reconheça se tratar de um modelo já utilizado, permanece entretida.

Nesse sentido, o foco crítico da obra reside no chamado trial by media, um problema recorrente nas Democracias Liberais. Encontrar o limite entre a liberdade de imprensa e o direito à privacidade, bem como ao de um julgamento justo, está longe de ser uma tarefa complicada. Nosso próprio país, inclusive, permanece em debate em busca de um ponto de equilíbrio. Não há muito tempo, o caso Escola Base demonstrou, de maneira crua, o quão prejudicial essa situação pode ser, não à toa há um Código de Ética para aqueles que atuam no jornalismo. Não existe uma resposta correta do que fazer, motivo pelo qual o problema ressurge de tempos em tempos.

Na narrativa, Richard é um homem simples, com um olhar idealizado da autoridade policial. Quando se propõe a seguir o protocolo quanto a um “pacote suspeito” deixado sob um banco, a despeito das tentativa de seus colegas em simplesmente levar a mochila ao Achados e Perdidos, não o faz com a intenção de ser um herói, mas sim de cumprir com o seu trabalho. Trata-se de uma característica que, aliada à sua extrema educação e à ótima performance de Paul Walter Hauser, o tornam um personagem extremamente carismático, daqueles pelo qual é impossível não se importar e/ou torcer pelo sucesso.

Todavia, subsistem alguns erros consideráveis, inerentes à representação de histórias reais. Primeiramente, tem-se como necessário um mínimo contexto acerco dos acontecimentos de 96. O longa faz um trabalho competente em inteirar o espectador acerca dos fatos, contudo, certamente aqueles que tiverem um maior conhecimento sobre o tema irão ter uma experiência cinematográfica mais completa – semelhante, por exemplo, ao que ocorreu com Era uma Vez em… Hollywood. Ainda, a crítica feita quanto ao modo de retratação da mídia a suspeitos acaba por se aplicar ao filme em si, ao menos no que diz respeito à retratação de Kathy Scruggs. A controvérsia em retratar a repórter, já falecida, da maneira feita, utilizando-se de estereótipos prejudiciais à sua memória, resultou, inclusive, em manifestações contrárias à obra.

De toda forma, certo é que a intenção da obra, qual seja, retratar o abuso autoritário por parte da força policial face a Jewell, bem como a falta de sensibilidade de uma mídia que se recusa a se ver como responsável por aquilo que publica, é alcançado. Os erros atrapalham a experiência e, ainda, levantam questões relevantes acerca do limite a ser dado a histórias que tomam fatos reais como base narrativa. Nesse sentido, O Caso de Richard Jewell não revoluciona o cinema, mas aproveita as suas bases para contar uma história universal.

Filme visto durante o 21º Festival do Rio, em dezembro de 2019