Crítica | Guardiões da Galáxia (Guardians of the Galaxy) [2014]

Nota do filme:

Após apostar em heróis conhecidos e/ou consagrados de suas HQs, a Marvel decidiu, mais uma vez, fazer uma escolha arriscada. Produzir um filme de origem, sobre um grupo de cinco personagens desconhecidos, sem nenhum apelo, poderia se mostrar uma decisão equivocada. Porém, como de costume, ficou provado que o nome do estúdio chegou em um patamar tão alto que apenas o selo do MCU basta para fazer rios de dinheiro e trazer multidões às salas de cinema. Prova disso é o total de quase 780 milhões de dólares arrecadados com Guardiões da Galáxia, quarto filme da segunda fase do universo cinematográfico, e o décimo desde o início dos projetos em 2008.

A escolha do diretor para a missão de comandar e roteirizar a história também se mostrou ousada. O novato James Gunn, que havia dirigido apenas filme de menor expressão como Seres Rastejantes (Slither) [2006] e Super [2010], deu conta do recado e impulsionou o seu nome para ser um dos mais reconhecidos e estimados diretores do gênero. Tanto que, três anos depois do sucesso do primeiro filme, recebeu a incumbência de ficar a frente do projeto de Guardiões da Galáxia Vol.2 (Guardians of the Galaxy Vol. 2) [2017], que, infelizmente, não conseguiu manter a qualidade e o ineditismo de seu antecessor. No ano seguinte, em julho de 2018, Gunn chegou a ser demitido dos estúdios vinculados à Disney após tweets polêmicos serem descobertos em suas redes sociais – depois de um pedido de desculpas e de longas negociações, o diretor foi recontratado e estará à frente da continuação da franquia, com lançamento previsto para após o fim da terceira fase da Marvel nos cinemas.

Gamora (Zoe Saldana), Peter Quill/Star-Lord (Chris Pratt), Rocket Raccoon (voz de Bradley Cooper), Drax The Destroyer (Dave Bautista) e Groot (voz de Vin Diesel)

Após perder sua mãe com apenas seis anos de idade, Peter Quill (Chris Pratt) é sequestrado por uma nave desconhecida e se vê obrigado a crescer a anos luz de seu planeta natal. Vinte e seis anos depois, vive a vida caçando recompensas e saqueando tesouros por toda a galáxia. Após roubar uma estranha orbe, o herói, autointitulado de “star-lord”, acaba virando alvo de um exército comandado por Ronan (Lee Pace), que pretende utilizar o artefato para destruir o planeta de Xandar.

Durante sua fuga, Peter acaba formando uma equipe de quatro estranhos seres que possuem interesses compatíveis aos seus. Formado por Drax (Dave Bautista), um guerreiro que anseia por vingança após a morte de sua família, Rocket (Bradley Cooper) e Groot (Vin Diesel), uma dupla de caçadores de recompensa que enxergam na situação uma boa forma de ganhar uma fortuna, e Gamora (Zoe Saldana), filha adotiva de Thanos e guerreira particular de Ronan, o inexperiente grupo precisa deixar de lado as diferenças para salvar a galáxia de uma perigosa ameaça.

Yondu (Michael Rooker)

Por mais que abra com uma cena bastante carregada pelo teor dramático, logo o filme trata de escancarar a sua veia cômica, que é bastante original e competente. Até o momento do lançamento de Guardiões, em 2014, era exceção presenciar bons filmes de super heróis que pudessem se enquadrar no gênero da comédia. Após seu estrondoso sucesso, porém, virou quase que uma regra construir as histórias do MCU baseadas nesse artifício – filmes seguintes como Homem-Formiga (Ant-Man) [2015], Doutor Estranho (Doctor Strange) [2016] e Thor: Ragnarok [2017] são boas provas disso. E aqui, o humor funciona muito bem. As personalidades de Drax, que entende todas as frases ao pé da letra, de Rocket, que leva a ironia e o sarcasmo como regra, e de Peter, que sempre tem um jeito peculiar de se safar das situações, casam muito bem e são as engrenagens perfeitas para que as pretensões do diretor funcionem.

Outro ponto que merece muito destaque é a trilha sonora. Anos depois de seu lançamento, ainda é muito comum ver alguém comentando sobre os sucessos dos anos 60 e 70 que embalam, de forma orgânica, as aventuras do grupo. E o melhor de tudo é que a justificativa para a presença do toca fitas de Quill e das músicas do Awesome Mix Vol. 1 faz bastante sentido para a história. Logo na primeira cena, vemos que o objeto foi um presente produzido pela mãe de Peter e entregue ao seu filho em seus últimos momentos de vida – o que explica o apego gigantesco do personagem pelo objeto. Unido à isso, as referências visuais da nave de star-lord e os easter eggs espalhados pelo universo ajudam a posicionar a história em uma linha temporal bastante definida.

Peter Quill/Star-Lord (Chris Pratt)

Entretanto, nem tudo é bem feito. Soa muito forçada a irmandade instantânea dos protagonistas e o seu desejo de realizar sacrifícios gigantescos por pessoas que acabaram de conhecer. Fora isso, ainda existem alguns discursos bastante bregas, recheados de mensagens positivas e piegas, que levam certos personagens a tomar decisões bastante questionáveis – isso sem mencionar a irritante presença de piadas machistas proferidas pelo protagonista. Para completar, o final do filme é baseado em um deus ex-machina (uma solução mirabolante para resolver uma situação que parecia impossível) inacreditável que serve unicamente para desacreditar e destruir completamente toda a personalidade forte e ameaçadora do vilão que foi construída no decorrer dos 121 minutos da obra.

Com belos figurinos, uma excelente maquiagem e uma interessante criação de mundos e personagens, Guardiões da Galáxia é uma ótima experiência para aqueles que estão cansados da seriedade excessiva dos filmes de herói. Ademais, a obra é de extrema importância para a criação da mitologia do universo Marvel e para a introdução de alguns dos personagens mais carismáticos da duradoura franquia.