Crítica | O Velho e a Arma (The Old Man and The Gun) [2018]

Nota do Filme:

A velhice é algo inerente ao ser humano, sendo que ela é algo que não pode ser impedido, deixando as pessoas cada vez mais próximas do fim da vida, bem como a reflexão sobre todos os momentos que já se foram e os que virão, com o tempo sendo a maior ameaça para realizá-los. Contudo, envelhecer não significa deixar de viver, apesar das dificuldades que surgem nesse período, porém sempre provando que o individuo pode ir além dessas limitações com a sua força de vontade.

Com isso, o filme em questão aborda a história real de Forrest Tucker, um assaltante que se tornou conhecido por escapar diversas vezes das prisões estadunidenses, sendo o foco da narrativa o período final da sua vida, mais precisamente durante a década de 80, em que ele realizava inúmeros assaltos em todo o país, simultaneamente em que é mostrada a perseguição policial e os seus relacionamentos nesse período.

Com roteiro assinado pelo próprio diretor, David Lowery (A Ghost Story, 2017), o enredo e os personagens acabam se tornando os pontos fortes da narrativa pois todos os elementos clássicos de qualquer filme do gênero policial são fundidos, não caindo no clichê pois desconstrói todas as situações corriqueiras dentro desse estilo, transformando-o em algo diferente, porém sem fugir da regra. Além disso, o roteiro, por causa de seus personagens, consegue humanizar todo o núcleo, seja através das relações entre si ou por mostrar os conflitos e esclarecimentos com que cada lado está lidando, fora que não estabelece em nenhum momento a divisão entre mocinhos e bandidos, e por causa disso acaba tornando a perseguição ainda mais interessante.

E vale ressaltar que o próprio roteiro utiliza de forma bastante adequada o fator da idade dos personagens, conseguindo mesclar drama com humor em alguns momentos, ilustrando ainda mais a estranheza da situação apresentada pelo grupo de assaltantes mais velhos, sutilmente apelidada de “gangue dos idosos”.

Apesar disso, quando a narrativa deixa de focar na parte dos assaltos, o filme acaba perdendo um pouco de ritmo e tensão que o move. Contudo essa pausa prepara o terreno para o futuro desfecho, que é feito de uma maneira que não se torna maçante, muito por conta do texto ser bem enxuto, tanto que cumpre sua proposta de maneira bem clara em seus 93 minutos de duração.

E para concretizar a sua visão, o diretor aposta em uma direção mais fluida, apesar do desenvolvimento do filme não ter tanto disso, o que acaba sendo um tiro certeiro pois consegue dar dinamismo as cenas dos assaltos com pouca coisa, seja utilizando uma câmera mais móvel, bebendo bastante da fonte da Nouvelle Vague francesa, ou por utilizar bastante o recurso do zoom, em que são mostrados os elementos que compõe a cena ou por grudar a câmera no rosto dos personagens, amplificando assim as emoções que são transmitidas nesses momentos.

Outro fator importante que contribui para isso é a edição do filme, que consegue ditar de forma ágil a narrativa ao contar a historia sem grandes pausas, conseguindo desenvolver tanto o lado dos assaltantes como o dos policiais, simultaneamente em que cria a tensão e rivalidade entre os dois grupos através de diversos recursos, como fade in e fade out. E, ela se torna ainda mais grandiosa pelo fato do diretor ter optado colocar datas nos acontecimentos, o que acaba criando esse sentimento de aceleração conforme o filme avança.

Apesar disso, quando o roteiro se utiliza do recurso de flashback para contar a historia, a edição acaba revelando para a audiência o que está por vir, porém sempre subvertendo a expectativa de quem está assistindo.

Contudo, o ponto alto do filme é a atuação de Robert Redford, que se mostra como um dos atores mais inesgotáveis da historia, transpirando charme com seu personagem, intoxicando todos que entram em contato com ele, tanto que as vítimas acabam se simpatizando pela cortesia que possui, demonstrada com um tom de voz baixo, alguns olhares fulminantes e, é claro, o sorriso que ele dá em todos os assaltos.

Em contraste a ele têm-se o resto do elenco que acaba servindo de alicerce para o protagonista, como por exemplo a relação de Redford com a personagem de Sissy Spacek, que é o seu interesse amoroso, ou o relacionamento com seus outros dois companheiros de assalto, interpretados por Danny Glover e Tom Waits. Porém a relação estabelecida entre o personagem principal para com o policial encarregado de persegui-lo, encarnado por Casey Affleck, acaba se tornando diferente pois entre os dois não há muito contato; Apesar disso, a caçada dos dois acaba servindo de motivação para ambos, o que faz com que necessitem um do outro para se desenvolverem na narrativa.

Aliada a isso, a trilha sonora consegue se destacar também, porém sem roubar o brilho da atuação de Robert Redford, pois ela acaba sendo predominante em quase toda a projeção, mesclando sons do jazz e da bossa nova, passando por violões acústicos e até utilizando uma orquestra para dar contornos épicos em determinados momentos, conseguindo criar a tensão e a ambientação necessária de forma bastante sútil, cumprindo assim com a sua função.

Além da trilha, o som tem um papel fundamental na hora de destacar o personagem de Redford, pois a arma que o protagonista possui não é mostrada em nenhum momento com ele a segurando, sendo apenas o barulho da sua trava necessário para criar a atmosfera dos assaltos, além de contribuir com um leve suspense sem se tornar excessivo. Sem falar que ainda há um tic-tac audível durante alguns momentos mais tensos, acabando por amplificar essa sensação.

Outro quesito que vale ressaltar é o papel do figurino de Robert Redford, que marca o assaltante com o seu chapéu marrom e o seu bigode falso, concebendo assim a sua persona que encanta a todos.

Portanto, o filme acaba sendo uma grata surpresa para os fãs do gênero justamente pela abordagem diferente que é feita por conta da idade dos personagens, sempre deixando claro que a velhice não é impedimento para deixar de fazer algo, afinal todos precisamos sentir o sopro da vida e para isso acontecer não há nada melhor do que fazer aquilo que desperte isso.