Crítica | O Pior Vizinho do Mundo (A Man Called Otto) [2023]

Nota do filme:

Baseado no livro de Fredrick Backman, o filme sueco Um Homem Chamado Ove (2015) foi aclamado pela atuação brilhante de Rolf Lassgård e chegou a ser indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro e Melhor Maquiagem e Penteados. Ninguém pediu, mas Hollywood logo tratou de fazer sua própria versão, algo que já virou moda numa cultura tão centrada no próprio cinema que torce o nariz sem remorso para produções estrangeiras. Por um lado, a vantagem é que mais pessoas poderão conhecer essa história tão cativante, mas, por outro, elas podem se sentir pouco incentivadas a correr atrás da versão sueca, que é melhor e mais original.

Em O Pior Vizinho do Mundo, que chega aos cinemas nesta quinta-feira (26/01), é Tom Hanks quem interpreta o rabugento Otto, o viúvo cujo único prazer é criticar os vizinhos da pequena ruazinha onde mora. Quando é forçado a se aposentar pela empresa onde trabalha, Otto para de ver sentido na vida, pois acredita que, se não pode ser útil de alguma forma, não existe mais nada que possa fazer. Mas quando uma barulhenta família mexicana se muda para a casa da frente, ele acaba dando início a uma amizade que vai virar seu mundo de cabeça para baixo.

Apenas pelo trailer das duas versões é possível ver o quão são parecidas, quase idênticas (também não é preciso explicar quem “se inspirou” em quem). O fato é que, cópia ou não cópia, O Pior Vizinho não apenas traduz a obra sueca para o inglês, como também suaviza o tom dramático e evidencia o lado cômico, transformando o filme no mais próximo possível de um longa “family friendly”. Mesmo que temáticas como morte, luto e suicídio estejam muito presentes, o diretor Marc Forster faz de tudo para tornar a experiência o mais apaixonante possível. O objetivo é alcançado com bastante facilidade, ainda que o custo tenha sido de o grandes doses de sentimentalismo cafona.

Tom Hanks em cena do filme O Pior Vizinho do Mundo.

Otto é briguento, reclamão, inconveniente, um homem sem papas na língua que anda sempre com cara de poucos amigos. Mas, ao mesmo tempo, vive solitário, sem amigos, carregando um luto do qual não consegue se livrar. Todo esse peso afeta diretamente sua rotina, e é interessante como o filme consegue “desvendá-lo” aos poucos, atiçando a curiosidade do espectador através de flashbacks bem-construídos. Mas nada disso seria possível sem a presença fundamental de Tom Hanks, que já há tempos vem se consolidando em papéis “fofos” como este. No início, é estranho vê-lo como um personagem tão mal-humorado, mas não demora até que o público se afeiçoe pelo jeito de Otto e embarque na história.

Uma espécie de Gran Torino (2008) da Disney, a versão americana de O Pior Vizinho consegue divertir e emocionar em doses semelhantes, mas é impossível ignorar o quanto ela se perde em sua própria fórmula. O problema não é a vontade de deixar as coisas mais leves, mas o fato de pesar a mão em certos aspectos. Ao se valer de personagens caricatos, com vozes e maneiras exageradas, o longa acaba passando do ponto na hora de construir humor e essa leveza excessiva afeta muito o jeito como o espectador pode receber a história. O exagero é tanto que essas decisões narrativas acabam infantilizando uma trama que precisa de certa sobriedade para não cair na pieguice.

O Pior Vizinho do Mundo aposta em recriar cenas que deram certo no filme de 2015, porém deixa de lado a seriedade que equilibra a trama e que é importante para o seu desenvolvimento. À certa altura, a trilha original interfere tão desnecessariamente na história, que acaba se sobrepondo aos eventos e forçando sentimentos que poderiam ser retratados de forma bem mais natural. A história criada por Fredrik é forte em sua temática, cativa e emociona por si só, mas não precisava ter sido infantilizada apenas com a justificativa de atrair certos tipos de público. Por via das dúvidas, fique com a versão original sueca, que traz a mesma história, porém sem duvidar da capacidade de entendimento do público.