Crítica | O Grande Circo Místico (2018)

Nota do Filme:

O universo circense encanta muito pelos mistérios dos bastidores, das histórias que ali se passam, sendo destrinchado em alguns filmes por grandes mestres do cinema, como Ingmar Bergman e Federico Fellini, dando sua visão sobre o assunto. No Brasil, Cacá Diegues resolveu contar também a sua versão do assunto em um projeto ambicioso, em que o resultado final se tornou desastroso.

“Em meio ao universo de uma tradicional família austríaca, que é dona do Grande Circo Knieps, nasceu um improvável romance entre um aristocrata e uma acrobata. Este é o retrato dos 100 anos de existência do Grande Circo e das cinco gerações do clã à frente do espetáculo e suas histórias fantásticas.”

O projeto se estabelece como algo gigantesco, propondo-se a contar essa narrativa que atravessa gerações, porém essa pretensão grandiosa é um dos problemas principais do filme pois, ao definir essa proposta, deve haver uma quantidade numerosa de personagens, que acabam não sendo desenvolvidos como deveriam, o que ocasiona a falta de fundamento em todas as decisões que tomam, bem como a estranheza de querer abordar assuntos polêmicos, dentre eles incesto e abuso de drogas.

Com isso, o roteiro não consegue trabalhar com o que já tem e ainda apresenta novos elementos na narrativa, salvo o personagem interpretado por Jesuíta Barbosa, única constante nas passagens de tempo, apelando para um recurso narrativo lamentável de forma a justificar o desfecho da história: um estupro.

Além disso, o terceiro ato se torna um festival de imundice, visto que além de empregar violência sexual, faz uso de incesto e prostituição para criar um fim poético (?), prejudicando ainda mais um filme que, até então, já não era bom. A própria questão do misticismo que envolve o circo é mal abordada, pois apenas é utilizado ao final do longa, o que não faz nenhum sentido.

Ademais, o roteiro sofre mais dano ainda com a montagem que, mesmo separando as fases do circo por capítulos, pula de um núcleo para o outro de forma abrupta, o que deixa o espectador perdido com os acontecimentos em tela, tornando-se ainda mais confuso por ter que contar os acontecimentos de cada geração, interligando uma a outra.

Ainda, a fotografia e a direção de arte funcionam com sentidos opostos ao que deveriam retratar sobre a misticidade do circo. A primeira, ao invés de deixar o local com esse ar fantástico, aplica muito cores escuras e sem vida, como o cinza, transformando o ambiente em algo estéril e lúgubre. E a segunda coloca em cena muitos objetos velhos e desgastados, fazendo com que aquilo pareça abandonado, o que apenas contribui para o fracasso.

O longa apenas não se torna um fracasso completo por conta da trilha sonora e do elenco, que, apesar de contar com diversas estrelas, tenta se salvar com todas as limitações. Por exemplo, Bruna Linzmeyer, com o pouco tempo de tela que tem disponível, consegue ser o centro das atenções. Jesuíta Barbosa é o personagem que mais aparece e por isso seu desenvolvimento é maior, o que dá mais espaço para o ator brilhar. E Vincent Cassel se sobressai do seu personagem estereotipado de “cafajeste”, apesar da preguiça do texto de aprofundá-lo.

Portanto, essa incursão de Cacá Diegues no mundo circense se provou muito falha, visto que seu filme se propôs a contar mais uma história de como o machismo se perpetua nas gerações, ao invés de ir para o lado mágico do espetáculo. De grande e místico esse circo não tem nada, apenas a perpetuação do patriarcado mesmo.