Crítica | Jogo Perigoso (Gerald’s Game) [2017]

Nota do Filme:

Jogo Perigoso acompanha Jessie Burlingame (Carla Gugino) e seu marido Gerald Burlingame (Bruce Greenwood) que, em uma viagem ao campo, tentam se reconectar por meio de um jogo sexual. Contudo, Gerald tem um ataque cardíaco repentino, deixando Jessie acorrentada à cama, sozinha e sem perspectiva de socorro.

Tomada pelo pânico, sem água ou comida, deverá tentar sobreviver, ao mesmo tempo em que se vê forçada a relembrar traumas passados envolvendo a sua família, sobretudo seus pais Tom (Henry Thomas) e Sally (Kate Siegel). É, também, atormentada por uma figura desconhecida, que sequer sabe se é real, a qual apelidou de Homem do Luar (Carel Struycken).

Baseado no livro de mesmo nome do mestre do terror Stephen King, tem-se uma narrativa contida, graças a um cenário naturalmente menor. Todavia, a história consegue aproveitar as próprias limitações, de modo a criar uma trama simples e intimista, de modo a criar uma trama simples e intimista que consegue, desde o início, imergir o espectador.

A adaptação de Mike Flanagan consegue trazer, à sétima arte, um conto significativo e socialmente relevante. Jogo Perigoso é, em suma, uma análise do desespero de uma mulher na busca pela sobrevivência, ao mesmo tempo em que, algemada à cama, se vê forçada a lidar com problemas os quais sempre evitou, por medo de como poderiam vir a afetar a sua vida.

Dessa forma, os desejos da protagonistas, embalados pela sua constante desidratação, tomam forma em sólidas alucinações. Assim, Jessie passa a dialogar com uma versão de seu marido e, também, de si mesma. As duas estão em constante embate uma vez que representam, respectivamente, a sua vontade de desistir – uma vez que Gerald sempre a tratou com descaso e é a personificação da sua própria negação em lidar com seus demônios internos – e a sua vontade de viver – uma versão plenamente resolvida da heroína, relembrando-a o tipo de vida que ainda poderá ter.

O roteiro encontra, ainda, oportunidade para externalizar os traumas passados da personagem, por meio de flashbacks bem posicionados na narrativa. Desse modo, a audiência pode se relacionar à sua infância, de forma que o drama do presente ganha maior profundidade e urgência. Dessa maneira, o conto consegue se expandir dentro de seu pequeno universo, abordando temáticas relevantes.

Tais fatores são complementados por excelentes atuações, sem as quais um filme contido como Jogo Perigoso não seria possível. Nesse sentido, Carla Gugino impressiona, carregando por si só boa parte da história. Bruce Greenwood e Henry Thomas fornecem apoio quando necessário, sempre acrescentando algo relevante à cena. Ainda, destaca-se o ótimo trabalho de Chiara Aurelia que, no longa, interpreta a versão mais jovem da protagonista.

Todavia, se por um lado o longa surpreende com um segundo ato envolvente e, mais importante, repleto de tensão, a narrativa peca em seu terceiro ato, sobretudo próximo ao final do filme. Isto porque, a despeito de uma conclusão satisfatória e catártica, o modo de execução deixa a desejar, com certos pontos da trama sendo meramente informados à audiência, por meio de diálogos extremamente expositivos.

Felizmente, o conjunto da obra é majoritariamente positivo. Seu início competente, desenvolvimento permeado de suspense complementados por excelentes atuações, especialmente de sua atriz principal, são fatores que fazem com que o filme seja digno de indicação, por mais que haja falhas ao final. No palco das adaptações do mestre do terror, Jogo Perigoso se consagra como uma das mais sólidas, mostrando que o cinema pode aproveitar o trabalho de um escritor como Stephen King.