Nota do Filme:
“Não era para humanos e digimons se conhecerem. Essa relação só traz infelicidade.”
Rui Owada
Digimon Adventure 02 – O Início segue a história dos protagonistas da série original dos anos 2000, agora jovens adultos, tentando conciliar sua amizade com os seus pequenos parceiros digimons. Contudo, quando uma enorme digitama surge acima da Torre de Tóquio, eles precisam entender qual a relação do evento com um misterioso homem chamado Rui Owada, que alega ser o primeiro escolhido humano da história.
02 sempre foi o “patinho feio” da franquia Adventure. 01 foi lançado no momento perfeito em que o Ocidente estava se tornando mais propenso a importar mídias do gênero, de modo que conseguiu capitalizar uma maior quantidade de fãs. O hype gerado pouco antes por Pokémon, é claro, foi de grande ajuda. Já 03, em que pesem problemas de continuidade – e não mais focar em um público infantil – apostou na nostalgia para reconquistar quem era criança na década de 90 e, ainda assim, com sucesso questionável.
Não é surpresa, então, que Adventure 02 – O Início tenha dificuldade em encontrar um tom para seguir de maneira definitiva. Dessa forma, o filme não sabe segue um caminho majoritariamente infantil, para tentar atrair novas crianças à saga, ou se tenta algo mais “maduro” para satisfazer aos antigos fãs, hoje adultos, a despeito de não contar com um fator de saudosismo tão grande quanto o seu antecessor. O resultado disso é uma mistura confusa de conceitos mais voltados ao terror e gore e elementos mais tipicamente associados às mídias infantis que não coincidem bem em conjunto.
Ironicamente, tivesse o longa se comprometido a um dos dois caminhos supracitados, poderia ter tido sucesso. Possivelmente suas melhores cenas se encontram nos dois extremos desse espectro: (i) o flashback de como Rui Owada lidou com seu parceiro, que conta com cenas tensas e, francamente, assustadoras (no bom sentido), e o (ii) a resolução do conflito de determinados conflitos, solucionáveis meramente por uma visão inocente e infantil dos temas (novamente, no bom sentido).
Essa inconsistência acaba por prejudicar a relação interpessoal dos personagens, em especial dos protagonistas da série 02, que aqui mais funcionam como coadjuvantes, limtando-se a entender o conflito entre Rui e seu antigo digimon, por meio de diálogos extremamente expositivos. Por conta disso, perdem-se grandes oportunidades, como traçar um paralelo entre ele e Ken, que, na série original, precisou passar por uma redenção para voltar a ter uma relação saudável com Wormmon, ou até mesmo com T.K., único dos 8 originais a perder seu digimon (ainda que temporariamente).
A bem da verdade, é possível que essa disparidade entre tons decorra, também, de uma dúvida sobre como seguir com a franquia em si. Afinal, tipicamente filmes como esse servem mais como uma forma de revitalizar a série, dando início à uma nova temporada – justamente por isso mais parecem episódios estendidos que um longa-metragem propriamente dito. Então, se houver interesse, demonstram que há diversos caminhos a serem seguidos. Ao final, porém, resta tão somente a sensação de oportunidade perdida.
Ainda, é importante notar que as alterações que Adventure 02 – O Início traz para a franquia como um todo são imensas. Trata-se do tipo de alteração que demanda uma construção muito maior do que um mero longa-metragem de menos de 1h30min pode alcançar. Pior, ao basicamente rever conceitos chaves da franquia de uma maneira tão leviana, possivelmente irá desagradar grande parte da base de fãs.
Assim, em que pese contar com pontos positivos, o resultado final acaba sendo uma obra muito desarticulada e com muito pouca consistência. A despeito de sequências – e ideias – de fato interessantes, Adventure 02 – O Início não faz o bastante para justificar a ida ao cinema.
Carioca, advogado e apaixonado por cinema. Busco compartilhar um pouco desse sentimento.