Crítica | Chamas da Vingança (Firestarter) [2022]

Nota do Filme:

Não é segredo para os fãs que Stephen King nunca gostou da adaptação para o cinema de seu nono romance, A Incendiária, lançado em 1980 e depois protagonizado pela talentosa Drew Berrymore, na época com quase dez aninhos. John Carpenter, que dirigiria o projeto, terminou afastado pelo estúdio por conta da decepcionante (e injusta) bilheteria de seu mais recente filme, O Enigma de Outro Mundo, e a partir daí a coisa desandou um pouco. Mark L. Lester acabou entrando em seu lugar, mas o resultado passou bem longe do hall de adaptações definitivas dos livros do autor. A ironia é que, quase 40 anos depois, a segunda adaptação da obra consegue ser ainda pior que a primeira, então podemos imaginar a satisfação do Sr. King.

Demorou, mas John Carpenter finalmente conseguiu participar do projeto, desta vez como compositor da trilha sonora, que é uma das poucas coisas salváveis no novo Chamas da Vingança, que estreia nesta quinta-feira (19/05) nos cinemas. A ideia de um remake geralmente é bem-vinda quando se fala em trazer algo mais consistente, sob um possível novo ponto de vista que faça sentido para a história, mas o que acontece no filme de Keith Thomas é justamente o oposto. Esse Chamas da Vingança é tão insosso e sem personalidade que deixa esvair qualquer virtude que seu anterior ou que a obra de King algum dia tiveram.

A trama gira em torno de Andrew McGee (Zac Efron), um homem que, durante a faculdade, participou de uma experiência científica e teve uma substância misteriosa injetada em sua corrente sanguínea. Por conta disso, ele desenvolve poderes telecinéticos, assim como Vicky (Sidney Lemmon), que também participou do experimento e, eventualmente, se tornou sua esposa. Eles acabam tendo uma filha, Charlie (Ryan Kiera Armstrong), que não só herda esses poderes, como também desenvolve a capacidade de provocar incêndios com a ajuda da mente. É por conta disso que a família luta para proteger a filha de uma agência secreta que quer capturá-la a todo custo e usar seus poderes como armamento militar.

Zac Efron e Ryan Kiera Armstrong em cena de Chamas da Vingança (2022).

Não é preciso ir muito longe no filme para perceber sua tendência ao desastre. Antes da primeira meia hora o espectador já pode atestar a falta de pulso narrativo, a completa confusão de ideias e uma mediocridade incompatível com o nome de peso de Stephen King. A impressão é que este novo Chamas da Vingança quer se mostrar muito maior que a própria obra em que é baseado, quer encher os olhos do espectador com explosões, embates e perseguições, esquecendo-se que nada disso basta para fazer um bom filme. Não existe nenhum momento na trama que busque aproximar o espectador da família McGee e isso é um problema, porque ele se baseia inteiro num suposto laço de amor entre pai e filha, mas só o que vemos é um desenvolvimento apressado e vazio.

A montagem é confusa e acaba piorando ainda mais um roteiro absolutamente pobre em diálogos e foco narrativo. Personagens surgem e são abandonados sem nenhuma explicação, a trama cheia de furos esbanja facilitações difíceis de engolir e só resta ao espectador o desespero de estar perdido numa história que vai de nenhum lugar a lugar nenhum. Talvez nas mãos de um diretor talentoso como o próprio Carpenter (nunca tão perto e tão longe) Chamas da Vingança poderia ter sua tão sonhada e merecida adaptação para as telonas, mas a inexperiência de Keith Thomas só serve para coroar um projeto há muito falido e sem esperanças.

Ryan Kiera Armstrong como Charlie em cena de Chamas da Vingança (2022).

Diante desse desastre, as atuações nem doem tanto. Zac Efron comanda a história, mas não convence como o pai protetor que faz de tudo pela cria. Sua escalação acaba sendo questionável, a fisicalidade do ator não diz muito sobre o personagem e suas limitações interpretativas ficam bem evidentes quando ele precisa transmitir sentimentos mais profundos. A pequena Ryan Armstrong possui algum talento e carisma, mas fica, injustamente, em segundo plano diante da estrela do filme e termina mostrando muito menos do que deveria. As demais atuações mal são dignas de nota, mas como já foi pontuado, não são nada perto de desastres ainda maiores.

Sem qualquer talento para ser um filme de suspense, Chamas da Vingança não é só um remake que prometia vingar a imagem A Incendiária diante dos fãs, mas também um exemplo triste dentro do hall de adaptações de Stephen King para o cinema. Insosso, sem personalidade e absolutamente esquecível, nem os efeitos especiais conseguem defesa nesse grande erro que logo estará em cartaz por aí à fora. Talvez apenas a trilha de John Carpenter, cuja ausência no projeto de 1984 tenha sido, afinal, o maior de todos os erros nessa história toda.