Crítica | Batem à Porta (Knock at the Cabin) [2023]

Nota do filme:

É difícil chegar em consensos quando falamos de M. Night Shyamalan. Um dos nomes mais controversos do cinema atual, há quem diga que o diretor nunca alcançará o patamar que ele próprio construiu com O Sexto Sentido (1999). Esquivando-se de opiniões alheias, Shyamalan parece absolutamente despreocupado em agradar quem quer que seja e continua trabalhando, investindo em projetos que lhe encantam e que, possivelmente, possam encantar seus fiéis seguidores. Durante esse período, ele passou longe de alcançar a unanimidade (e também a qualidade) de seu maior sucesso, mas deu à luz uma porção de filmes criativos, envolventes e cheios de reviravoltas mirabolantes, sua marca registrada. Com o mais recente Batem à Porta, ele parece querer se aventurar por novos caminhos, mas acaba produzindo um dos longas mais mornos de sua carreira até então.

Com data de estreia marcada para quinta-feira (02/02) nos cinemas nacionais, Batem à Porta acompanha o casal Andrew (Jonathan Groff) e Eric (Ben Aldridge) e sua filhinha Wen (Kristen Cui), que estão passando as férias numa floresta afastada da cidade. Tudo vai bem até quatro pessoas invadirem a cabana e fazer os três de refém para forçá-los a fazer um sacrifício que poderá impedir o apocalipse. Eles terão de escolher algum membro da família para morrer nas próximas 24 horas ou o armageddon será inevitável.

Sem muito tempo para conversa, logo nas primeiras cenas o espectador já é apresentado ao grande dilema dos protagonistas e acompanha momento a momento o desenrolar da situação. Não é fácil para Andrew e Eric (nem para o público) acreditar que a história contada por Leonard (Dave Bautista) e companhia ao invadirem a cabana é verdadeira. Eles são um casal homossexual e, apesar do grupo ser, aparentemente, formado por pessoas comuns e “pacíficas”, não podem ignorar que tudo isso pode não passar de uma conversa bizarra de fanáticos religiosos. Os noticiários mostram que eventos catastróficos, de fato, estão acontecendo ao redor do mundo, mas será que tudo não foi forjado por motivos de pura homofobia?

Baseado no livro de Paul Tremblay, O Chalé no Fim do Mundo, Batem à Porta conta com o talento nato de Shyamalan para construir tensão, seja através da mise-en-scène, planejada para trazer uma sensação claustrofóbica para o ambiente da cabana, de enquadramentos e closes característicos do diretor ou pelo ritmo que se torna cada vez mais intenso. Como em todo bom thriller, essa construção de expectativa e inquietação por meio da técnica é fundamental para segurar o espectador na cadeira, mas um bom roteiro é ainda mais importante. Aqui, infelizmente boa parte da tensão é sacrificada por um roteiro potencialmente forte que erra (e muito) no desenvolvimento de sua premissa.

Jonathan Groff e Kristen Cui em cena de Batem à Porta.

Os invasores precisam que Eric e Andrew tomem uma decisão o mais rápido possível, mas essa sensação de urgência demora muito a aparecer. Mesmo que as ameaças nunca partam da agressão física, o espectador conta com a própria curiosidade para continuar interessado na história, porque ela não parece querer, de fato, provocar qualquer reação. As poucas explicações dadas no início não conseguem produzir o efeito de intrigar o público, pelo contrário, fazem com que ele duvide mais e mais do que fala o grupo de invasores. E pior: os noticiários televisivos que eles usam para corroborar o que dizem parecem tão falsos, tão forjados, que só pioram a situação.

Em certos momentos, o longa investe em flashbacks do passado do casal e da filha, mas as informações dadas influenciam em quase nada o andamento da narrativa. Em compensação, chega um certo ponto no filme em que todas as explicações são entregues, não fica nada para a imaginação do espectador. É uma tendência de Shyamalan deixar tudo bem amarrado, mas no caso de Batem à Porta, que é um longa com potencial para boas discussões e desenvolvimento de teorias, fica a sensação de que algumas coisas podiam ser deixadas em aberto. Aqui, essas respostas bem-explicadas não beneficiam a narrativa, acabam empobrecendo uma história que já vinha mal das pernas.

A boa notícia é que as atuações entregam a emoção necessária para reforçar o que o filme tem de bom, sobretudo a de Dave Bautista, surpreendente como o professor gentil e grandalhão por quem o público acaba simpatizando. É realmente uma pena que o filme não esteja à altura da entrega do ator. Batem à Porta vai atrair o devotado (e, às vezes, apenas curioso) fã-clube de Shayamalan, mas não promete figurar entre seus melhores trabalhos. É um filme contido e pouco impactante que prometeu muito mais que cumpriu. Mas, verdade seja dita, qualquer Shayamalan meia-boca é melhor que muito thriller que a gente encontra por aí.