Crítica | Mártires (Martyrs) [2008]

Nota do Filme:

Mártires acompanha a história de Lucie (Mylène Jampanoï) que, quando criança, escapou de um cativeiro onde era torturada diariamente. Quinze anos após sua fuga e ainda atormentada pelos fantasmas de seu passado, busca vingança contra seus captores. Para completar sua missão, conta com a ajuda de Anna (Morjana Alaoui), amiga que conheceu no centro que a acolheu quando criança.

Há um subgênero do terror conhecido como torture-porn (antigamente chamado de splatter). Nele, tem-se o uso explícito de gore e grande violência gráfica. Apenas a título exemplificativo, Jogos Mortais – e suas sequências – e O Albergue – parte I e II – são filmes que, nos anos 00’s, ajudaram a revitalizar o gênero.

Pois bem, uma vez que aborda traz tamanha brutalidade de maneira tão explícita, ressalta-se que Mártires não é para os mais sensíveis. No decorrer de suas quase 2h de duração o longa traz imagens fortes e perturbadoras, como tortura, autoflagelação, entre outras. Justamente por apresentar cenas tão gráficas, o chamado torture-porn conta com grandes opositores. Todavia, qualquer gênero do cinema possui qualidades e defeitos, de modo que se deve analisar não o estigma que carrega, mas sim o que de fato transmite ao espectador.

                                                          

                                                

Nesse sentido, o começo da história é competente em nos apresentar personagens por quem simpatizar. Qualquer instabilidade de Lucie é compreensível, ante o seu passado brutal. Ao mesmo tempo, Anna tenta dar a confiança que a amiga nunca recebeu, ao mesmo tempo em que busca ajudá-la sempre que possível. Tais fatores são complementados pelas interpretações de Morjana Alaoui e Mylène Jampanoï, que possuem boa química juntas, por mais que as performances em si não sejam dignas de grandes elogios.

Há um trabalho intelectual – ainda que simplório – por trás do fantasma que assombra Lucie. Esse elemento específico nunca tenta ser uma revelação, o que é bom, vez que é evidente desde a primeira aparição. Assim, é interessante notar que existe um esforço por parte do criador da obra em transformá-la em algo mais que “um estudo sobre métodos elaborados de tortura e punição”.

                        

                         

Entretanto, a despeito desses pequenos acertos, o saldo do filme é negativo. Aponta-se, primeiramente, a pouca credibilidade das ações de Anna. Evidentemente é necessário levar em consideração a situação de estresse que vive, porém, não se tratam de atitudes meramente imprudentes mas sim estranhas, no sentido mais puro da palavra. Tal fator compromete qualquer desenvolvimento que a história pudesse vir a ter.

Ainda, por mais que seja fornecido ao espectador, no começo do terceiro ato, uma razão para todas as tragédias que ocorreram até o momento, o resultado jamais é satisfatório, de modo que qualquer violência anterior – e posterior – à declaração parece gratuita uma vez que, na prática, o é. A motivação não tem o peso que pretendia. Muito é dito acerca de um caráter etéreo/filosófico, todavia, pouco é alcançado, tornando toda a questão pretensiosa demais para ser internalizada por quem assiste.

Desse modo, o objetivo mais parece ser chocar a audiência do que, de fato, passar qualquer mensagem que seja. Ao final, mais parece uma mera desculpa que o roteiro teve que apresentar para justificar a barbárie que ocorre em tela. A força motriz do longa, então, resta prejudicada, tornando a experiência cinematográfica vazia.

                        

                                           

Sendo assim, graças a alguns pequenos acertos no primeiro ato, bem como à boa química das atrizes principais, Mártires pode vir a agradar aos fãs de seu subgênero. Entretanto, os não entusiastas dificilmente encontrarão satisfação. Ao buscar uma profundidade que não existe, a obra acaba por se sabotar, comprometendo a sua qualidade como um todo. Com um saldo final bastante prejudicado, o filme apenas não é esquecível por conta de sua excessiva violência.