Um dos maiores nomes da sétima arte dos últimos tempos, o cinema de Agnès Varda é a síntese da autoria. Entre a ficção e o doc-ensaio, Varda se concretizou ao submeter a sétima arte a um olhar extremamente poético e ao mesmo realista, de modo a sujeitar o espectador a uma experiência cinematográfica politicamente lúdica e consciente. Reconhecida por trabalhos como Cléo das 5 às 7 e Os Renegados, Varda encontrou nos curtas-metragens a oportunidade de exercer ao máximo o seu olhar fotográfico e ensaístico para o mundo e o ser humano.
Sua subjetividade íntima, convidativa e empática resultaram em uma miríade de trabalhos extremamente íntima e convidativa, permitindo, assim, que o público estabeleça uma relação com temas distintos, entre eles racismo, autoritarismo, feminismo e desigualdade, e seus personagens sem que se sinta intimidado por uma arte meramente panfletária.
A fim de apresentar outras facetas da diretora belga, o Cinematologia apresenta esta lista com alguns curtas-metragens que representam algumas características do cinema de Varda, como a cinescritura (relação da imagem com a palavra), desnaturalização do clichê, performance e, claro, as temáticas humanizadas, e foram geniais na arte de estabelecer diálogos entre os mais diferentes povos e contrariar verdades vistas como únicas. Em suas palavras: “Política é quando eu percebo o mundo de um jeito diferente que eu via.”
Tio Yanco (1967)
A relação familiar entre Agnès Varda e Jean Varda é a porta de entrada para uma viagem a São Francisco e seu oássis sociocultural. Durante uma viagem para promover seu último filme, Varda decide conhecer um parente com a qual ela nunca teve contato: o pintor Jean Varda, mais conhecido como Tio Yanco. Sob uma direção antirrealista e poética, Agnès Varda aborda a ditadura da Grécia, o estilo de vida em São Francisco, capitalismo e até mesmo os conceitos de pintura e arte.
Saudações, Cubanos (1964)
A bagagem fotográfica de Varda ganha vida nesta curta sobre a Cuba. A partir de uma fotomontagem de mais de 1000 imagens, a cineasta registra a vida dos cubanos quatro anos após a chegada de Fidel Castro ao poder. Com uma fotografia preta e branca, o espectador se depara com imagens de uma Cuba tingida pós-revolução, seus hábitos, relações e símbolos culturais.
Mur Murs (1981)
Um resgate da história local a partir de um olhar minucioso para aquilo que no cotidiano passa batido. Em Mur Murs, Varda usa as artes presentes em muros da cidade para contar a realidade, verdades e intempéries dos moradores das regiões de Venice Beach a Watts, colocando Los Angeles sob uma ótica que foge do romantismo.
Panteras Negras (1968)
Um dos curtas-metragens mais conhecidos da filmografia, Panteras Negras é uma das odes mais bonitas e potentes à resistência negra. Com o seu olhar consciente e empático, Varda retira totalmente a sua voz para dar espaço aos integrantes do grupo político, de modo a ressignificar gestos e símbolos tão banais para alguns e tão impetuosos para outros, como a dança e o cabelo.
Os Catadores e Eu (2000)
Agnès Varda se volta para os esquecidos e marginalizados em uma viagem pelas ruas, estradas e vielas da França ao registrar a rotina dos catadores da cidade. Sejam eles por escolha, por crença ou por necessidade, os catadores se tornam, novamente, os protagonistas dos trajetos por meio de uma direção que foca na beleza e simbolismo dos detalhes e da realidade dos atos e objetos em cena.
Jornalista Cultural, Crítica de Cinema e Produtora Executiva.