Crítica | Turbo Kid (2015)

Um longa nostálgico e muito inteligente, que permeia o brutal, o insano, o gore, sem deixar de ser sensível e extremamente hilário.  

Antes de tudo, esse filme está disponível no catálogo da Netflix. Fica a dica.

Os anos 80 seguem em alta, como uma tendência ao sucesso e o trio de diretores, François Simard, Anouk Whissell e Yoann-Karl Whissell, parecem beber direto da fonte para suas inspirações, ao menos fica evidente essa teoria em suas obras, incluindo seus curtas-metragens: Ninja Eliminator (2010), Demonitron: The Sixth Dimension (2010) e ainda T is for Turbo (2011).

Em Turbo Kid, temos elementos sinceros da década de 80, tanto na estética, roteiro, quanto na trilha sonora, aqui orquestrada por sintetizadores, algo muito comum na época. É difícil falar sobre Turbo Kid e não mencionar Mad Max, pois o filme parece uma produção “C” baseado nas obras de George Miller, entretanto, uma produção “C” hilária e insana.

O filme se passa no futuro pós-apocalíptico do ano de 1997, onde um garoto solitário, catador de sucatas e obsecado por histórias em quadrinhos do Turbo Rider, seu herói favorito, se depara com uma amizade inesperada e um tanto involuntária ao ser abordado por Apple, uma menina misteriosa e muito persistente. Logo quando a amizade dos dois ganha laços mais sólidos, a menina acaba sendo sequestrada por um capanga de Zeus, que propaga o terror aos sobreviventes daquelas terras devastadas,  obrigando assim o garoto a entrar em uma jornada insana e sanguinária para resgatar a menina das mãos de Zeus.

Sem contar mais do que se deve sobre a história do filme, se pode dizer que a experiência do longa é cativante e surpreendente. A minuciosidade estética em seus cenários, em sua paleta de cores, nos figurinos, em sua trilha sonora, nos transporta para ideia “distópico-futurista” (acabei de inventar essa palavra) dos anos 80 com uma perfeição assombrosa.

O seu roteiro alterna em muitos subgêneros, do gore à comédia romântica adolescente, perambulando por esses seguimentos com uma propriedade hilariante. Cenas de perseguição que vimos em Mad Max, sendo reproduzidas dentro de outro contexto por bicicletas. As lutas dignas das séries de heróis japoneses da década de 80, com uma pegada gore fantástica.

O gore aqui não incomoda como acontece em muitas outras obras, é tão pirotécnico o show de sangue espirrando e membros explodindo, que de uma forma tosca e muito simplória o filme consegue transformar em um espetáculo cômico as cenas mais brutais e bizarras que já foram presenciadas no cinema. Do insano ao ridículo o roteiro funciona, auxiliado pela estética narrativa que arranca gargalhadas com a sua forma inteligente de reproduzir efeitos especiais baratos.

Não existem piadas, ou deixas inteligentes, ou falas cômicas, o filme se torna hilário por sua construção. Os personagens constroem uma atmosfera carismática, é inegável assistir ao longa e não simpatizar com os heróis e até mesmo com os vilões. De atuações propositalmente forçadas e exageradas, o elenco é magistral na entrega do que é proposto.

O filme tem o seu lado sensível, e mesmo permeando vários tons, a sensibilidade da trama está o tempo todo presente, arrebatando o espectador que a pouco estava se perguntando sobre o que “diabos” estava a assistir.

Contagiante de um jeito peculiar. Nostálgico de uma forma ocular e sensorial. De uma paleta de cores vibrante, a uma fotografia sensível, tanto quanto sua narrativa, que fala de solidão, amizade e perda, de uma forma no mínimo absurda. Turbo Kid é carismático, nostálgico,  tecnicamente muito bem construído. Um filme de baixíssimo orçamento, com recursos limitados, entretanto apenas em valores monetários, pois diante da capacidade criativa de seus diretores a falta de dinheiro algum impõe limites.

Dê uma forma simples, Turbo Kid consegue contagiar até seu espectador mais exigente. O filme funciona em um contorno cômico e inesperado. É uma agradável surpresa vinda do cinema independente, relembrando a era de ouro da ficção científica, que agora padece de criatividade e ostenta superproduções vazias e repetitivas em um universo cada vez mais necessitado por originalidade. Um filme no mínimo surpreendente e adorável da forma mais bizarra possível.