Crítica | Os Iniciados (Inxeba) [2017]

Ritos de passagem são comuns em diversas culturas, seja para representar a transição desse momento para o próximo ou seja para a transformação do indivíduo em sua forma completa, o que é inegável entre todos eles é o caráter de dogma que eles recebem. E o que acontece quando se começa a questionar um dogma? Ele deixa de fazer sentido pois não há um embasamento consistente que faça com ele possa ser mantido, analisando logicamente.

Partindo dessa premissa, o filme traz a narrativa de um grupo de jovens que estão transitando da adolescência para a vida adulta, onde eles são circuncidados e devem aguentar toda a dor da cicatrização durante duas semanas para que assim possam se tornar homens. E, a narrativa será direcionada por um dos jovens, que acaba sendo discriminado do grupo por ser rico e homossexual, questionando qual todo o sentido desse cerimonialismo. Em contraste a isso tem-se seu instrutor X, que o auxilia em todo esse processo e acaba tendo um caso com ele, porém X é apaixonado por outro instrutor, que é casado com uma mulher, possui filhos e por isso este acaba reprimindo seu desejo.

(The Wound/Divulgação)

É gritante a forma com que o longa questiona a necessidade de rituais de transição, a fragilidade da masculinidade e a abominação ao homossexualismo, face a uma cultura retrógrada. A desconstrução do estereotipo de “machão” é feita de maneira simples e singela, resultando em uma belíssima cena de amor entre os personagens. E ainda o longa traz como os homens tem a necessidade de “ser homem”, de terem que ficar reafirmando a dominância todo momento, de que a partir da conclusão do rito eles serão homens, ao pé da letra, como se ocorresse alguma mágica de explosão de testosterona entre eles após o prepúcio ser cortado.

Além disso, vemos cenas de um jogo de luz e sombra realizado pelo diretor John Trengove, que são feitas com maestria, aumentando ainda mais a qualidade visual de alguns momentos. E, isso se torna mais importante ainda por se tratar do cinema africano, visto que ele acaba não tendo tanta visibilidade e conseguindo colocar dois filmes entre os 9 pré-selecionados ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro.

Logo, esse filme se torna uma grata surpresa, tanto pelo tema que se trata quanto pelo destaque que gera, pois faz um debate interessantíssimo sobre masculinidade, onde tudo cairia por terra se ocorresse apenas uma mudança de consciência da sociedade e de toda necessidade de reafirmação de dominância heterossexual masculina sobre tudo e a todos.