Sr. Sherlock Holmes (2015) nos dá um Sherlock que certamente nunca vimos antes, e não voltará apressadamente. Ele tem 93 anos, se aposentou na costa da britânica e bucólica Dover do século XX, tendo agora a apicultura como o hobby manso e poético que tudo consome do ex-detetive. O que parece uma projeção futura e bem humorada citada por um Sherlock jovem e sem perspectiva se torna realidade com a adaptação da novel de 2005, Um Leve Truque da Mente, do autor Mitch Cullin.
Ainda que modesta, a misteriosa – enquanto impopular – ambientação trazida para as telas se dá o desafio de lançar o detetive mais famoso do mundo na guia de três histórias que aparentemente não se conectam. O labirinto de sua mente que sucumbe à demência e as inabilidades rotineiras substitui as traições elaboradas, venenos exóticos e o egocentrismo refinado que sempre acompanharam a mente privilegiada.
Watson e Mrs Hudson estão borrados no fundo da narrativa; O irmão Mycroft (John Sessions) também faz parte dos que não participam com qualquer grande signifância além de citações pouco permeáveis na história pelos relatos do próprio Holmes do presente. Os principais companheiros de Holmes são a governanta de Dover, a Sra. Munro (Laura Linney), e seu filho Roger (Milo Parker), que tocaram de maneira muito sólida e afetada pelo jovem ator britânico.
Como seu herói homônimo, o filme entra e sai de foco enquanto penetra em seu baralho de memórias, um toque amplo aqui, um pouco mal passado lá, às vezes satírico, mais frequentemente caprichoso. No entanto, o roteiro de Jeffrey Hatcher combina perfeitamente a interação entre o mito e a memória – ambos não confiáveis e maleáveis – enquanto McKellen nutre a natureza mutável de seu personagem com precisão, maleabilidade e sobretudo entrega – sendo a mais óbvia atribuição.
Tendo Holmes como o personagem fictício mais filmado de todos os tempos, é impossível deduzir o que além do jovialismo revisionista a obra busca acrescentar com significância. No fim, trata-se de quase uma metáfora readaptada de filmes mais antigos sobre a particular rotina do detetive, ainda que para esta abelhas sejam a sua companhia nos diálogos mais marcantes. A solidão é um tema: mas foi inesquecivelmente explorada por Billy Wilder, em seu manifesto sobre o personagem em A Vida Íntima de Sherlock Holmes (1970). Galgada na maioria das intenções do autor e nas suas raras paradas com o espelho ou uma pista para definir finalmente a chave da mente humana, Holmes sempre termina em círculos que dão em si mesmo – algo que definitivamente não é novidade nas adaptações de suas histórias e reinvenções destas para o cinema.
Tratando-se da matriz do filme, é quase previsível a unanimidade positiva nos fãs de Conan Doyle, McKellen e Condon. Os fãs do famoso seriado de televisão – não necessariamente do mesmo grupo – podem negativar a obra dentro da sua particular velocidade e engenhosidade. Isso é Holmes intencionalmente desacelerado da indústria usual para um ritmo manco, reflexivo e no final da vida: podemos ousar chamar de refrescante, mas nunca moribundo. É um filme para vasculhar, pegando pistas antigas, considerando o significado delas, e colocando-as na palma da sua mão.