Crítica | Rua do Medo: 1994 – Parte 1 (Fear Street: 1994)

Nota do Filme:

Filmada concomitantemente, a trilogia Rua do Medo é uma adaptação da extensa série homônima de livros adolescentes de terror escrita por Robert Lawrence Stine (também autor de Goosebumps, outra franquia de sucesso). No primeiro capítulo, somos apresentados aos habitantes de Shadyside, cidade que há séculos é marcada por crimes bárbaros e misteriosos, em radical contraste com a vizinha Sunnyvale, que desfruta de aparente interminável paz. Após mais um evento chocante, Deena (Kiana Madeira), Samantha (Olivia Scott Welch), Josh (Benjamin Flores Jr.), Kate (Julia Rehwald) e Simon (Fred Hechinger) se veem alvo de uma implacável maldição e precisam encontrar uma maneira de sobreviver.

Se por um lado a produção insere e distribui bem as referências a clássicos cinematográficos do gênero, por outro, o início já preocupa com a quantidade de informações mastigadas e expositivas que surgem através de jornais e entrevistas, um artifício que se torna mais frequente do que o ideal.

O que mais prejudica 1994, no entanto, é a irregularidade adotada ao longo de sua história, que não consegue atingir o tom entre o terror e o cômico com os mesmos êxitos que produções recentes como A Babá (2017) e Feaky – No Corpo de um Assassino (2020), embora seja um projeto mais ambicioso que ambos. E tão importante quanto o equilíbrio entre os dois gêneros é fazer o trânsito entre eles de modo que um não acabe por anular o outro, o que infelizmente não ocorre aqui. Isso tira o peso de momentos-chave da trama e dificulta nossa aproximação com os personagens. É como se mirasse no ótimo Terror nos Bastidores (2015), mas acertasse na medíocre série Scream Queens (2015-2016).

Outro ponto que o enfraquece é a utilização da trilha sonora, que narra demais o que está se passando, comentando diversas cenas e comprometendo, assim, qualquer criação de suspense – além de escolhas pouco criativas, como a transição musical quando o ônibus escolar passa de Shadyside para Sunnyvale, ressaltando a diferença entre as duas localidades. O emprego das músicas também é feito sem cuidado, seja pelo excesso (ouvimos meia dúzia nos primeiros vinte minutos), seja por mostrar Deena acompanhada de versos como “I’m only happy when it rains/I’m only happy when it’s complicated“, “Nobody loves me, it’s true/Not like you do” e “But I’m a creep/I’m a weirdo“, uma maneira nada sutil (e, de novo, pouco criativa) de nos dizer sobre a personalidade e indicar os problemas vividos pela jovem.

Mas há alguns momentos mais inspirados, como quando a diretora Leigh Janiak brinca com a nossa percepção na cena que introduz o interesse romântico da protagonista (e que nos convida a refletir por que nossa expectativa foi subvertida), ou quando o apagar das luzes de um refletor serve de metáfora para um término de relacionamento, ou quando uma briga particular é intercalada com uma briga coletiva, destacando os vários níveis de conflitos ali presentes e quão difícil será superá-los. E merece um elogio a direção de arte que inclui um cartaz de “proibido armas” na parede do colégio, um aviso que pela simples necessidade de existir já soa absurdo, mas que vai ao encontro da realidade escolar dos Estados Unidos.

Não deixa de ser curioso que, ao encerrar com praticamente um trailer da sua sequência, o filme parece deixar escapar que não confia plenamente no próprio sucesso, como se nos prometesse que a segunda parte conseguirá criar algo que a primeira não foi capaz de proporcionar. Ato falho ou não, diz muito sobre o capítulo inicial da trilogia.