Crítica | O Mau Exemplo de Cameron Post (The Miseducation of Cameron Post) [2018]

Nota do filme:

O Mau Exemplo de Cameron Post aborda a vida da adolescente Cameron (Chloë Grace Moretz) que, após ser pega com sua amiga Coley (Quinn Shephard) no banco de trás de um carro na noite do seu baile de formatura, é enviada a um centro de conversão para jovens com “impulsos homossexuais”. Lá, recebe “tratamento” do Reverendo Rick (John Gallagher Jr.) e de sua irmã Dra. Lydia Marsh (Jennifer Ehle) para curá-la de sua atração pelo mesmo sexo.

Contudo, ao mesmo tempo em que é exposta a um constante abuso emocional disfarçado de terapia, pela primeira vez tem a chance de se conectar a pessoas que entendem pelo que está passando. Desse modo, rapidamente faz amizade com Jane (Sasha Lane) e Adam (Forrest Goodluck) e, assim, passa a descobrir mais sobre si mesma.

Vencedor do Grande Prêmio do Júri do Festival de Sundance de 2018, O Mau Exemplo de Cameron Post aborda a temática de despertar sexual de uma maneira pouco usual, uma vez que contém bastante cinismo e sarcasmo, típico da faixa etária dos personagens foco. Cameron é forçada por seus guardiões conservadores a permanecer nesse centro de conversão para jovens, e a diretora Desiree Akhavan escolhe escancarar o absurdo da situação por meio da comédia, uma metodologia diferenciada em contos do tipo.

Não é de se falar, ressalta-se, que o longa é desprovido de drama e/ou seriedade. Ao contrário, quando ocorrem, são extremamente impactantes, justamente por haver essa justaposição entre os gêneros. Assim, a chave para o sucesso da narrativa está, justamente, na correta transição entre leveza e seriedade, o que, felizmente, é feito com maestria, jamais parecendo artificial ou forçada. Concomitantemente, o ritmo rápido da história em nenhum momento se arrasta, tornando a experiência fluída e natural.

O roteiro, porém, não busca desenvolver cada membro individualmente. Ao contrário, à audiência é informado por qual motivo cada um deles se encontra no local, mas, via de regra, nada mais é dito acerca de sua individualidade. Nesse sentido, tem-se o próprio centro de conversão como um – importante – personagem. Isto porque se explora, de um jeito coletivo, a forma como funciona o dito tratamento e a maneira pela qual é internalizado pelos residentes, cada qual com a sua peculiaridade. Há, assim, um forte senso de “ser” do centro de conversão, quase como uma entidade própria e, portanto, integrante da obra.

Contudo, essa ausência de desenvolvimento é sentida no decorrer do conto, sobretudo quando consideramos todas as possibilidades a serem exploradas por esse meio. A história conta com fortes traumas individuais, de modo que é um dos raros casos de um longa que se beneficiaria de mais tempo de tela. Nem mesmo o trio principal recebe a devida atenção, diminuindo, de um modo geral, a sua jornada de amadurecimento.

De qualquer forma, no que diz respeito à atuação, tem-se que não há pontos negativos no filme. Chloë Grace Moretz dá vida à Cameron Post, em uma performance contida, mas ainda assim impactante. Owen Campbell interpreta Mark, outro jovem no centro de conversão que, em determinada cena, hipnotiza a audiência de maneira tão intensa que chega a impressionar. Ao mesmo tempo, tal fator torna mais evidente a problemática levantada no parágrafo anterior.

Sendo assim, tem-se que O Mau Exemplo de Cameron Post cumpre, com folga, a sua função. Sua temática mais sarcástica o difere de outros longas do gênero sem diminuir a sua importância. Pelo contrário, ela o torna acessível a um público alvo diferente, aumentando o alcance de sua mensagem. Infelizmente, determinadas escolhas narrativas acerca do desenvolvimento de seus personagens impedem a obra de atingir todo o seu potencial.


Filme visto durante o 20º Festival do Rio, em novembro de 2018