Crítica | O Culto de Chucky (Cult of Chucky) [2017]

Nota do Filme:

A ressurreição do clássico para o ano de 2017 atraiu um público pouco esperançoso sobre a sua qualidade. As histórias usadas em Chucky, sem exceções em se preocuparem com a própria qualidade, carregam nas costas a responsabilidade de manter vivo a modalidade slasher ainda que fora dos descobridores anos 80 e 90. Com o mérito nostálgico ou o que quer que faça alguém em sã consciência ir ver o famoso boneco no cinema, tornar a diminuí-lo por fatores como a já citada história ou a qualidade final é impossível. O Culto de Chucky começa e termina como se espera dele: um bom filme da série que inova só na criatividade das mortes e na bizarrice dos diálogos vindos das muitas versões do boneco neste filme.

O filme se apresenta com a óbvia inovação técnica e abordagem modernizada do horror trazido pelo boneco assassino. Não existem mais sustos tão gratuitos como nos filmes mais antigos, ainda que aqui a fidelidade das mortes passem a junto da história tomar um peso maior dentro do confinamento do hospital psiquiátrico para criminosos insanos. A construção da narrativa dentro do segundo e quase inóspito local credita ao filme a sua fatia do terror sem esforço algum. Embora diferente dos outros filmes, onde Chucky consegue literalmente atingir uma simbiose extremamente sinistra com os ambientes residenciais e quartos apertados, aqui ele é declarado como mais um transeunte pelos muitos corredores e portas do pouco iluminado hospital. O minúsculo corpo de funcionários é suficiente para criar uma expectativa de isolamento clara a medida que o assassino engrena sua sessão de homicídios.

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Como esperado, o filme traz a grande residualidade narrativa da trama de 2013, A Maldição de Chucky. Com o pequeno núcleo de personagens transtornados e preparados para os acontecimentos da sequência, a trama do novo filme passa se focar em uma possível conclusão, ou pelo menos no clímax definitivo de uma. Protagonistas não são realmente comprometidos com a presença do boneco neste novo filme. Ainda é tranquilizante imaginar que a ameaça de Chucky sob aqueles que ele realmente quer ver sofrer ainda é tão pouco rancorosa e extremamente infantil. Esse tom satírico do boneco nunca o prejudicou, mas a história nunca passou ilesa desde as suas origens por conta disso. Existem os sujeitos a morrer, como na maioria dos slashers, e os sujeitos a sentar e assistir tudo isso acontecer diante de seus olhos. Gritar, correr e possivelmente escapar em uma finalização épica em um grande incêndio ou fuga de helicóptero, essa acaba sendo a analogia de suas funções aqui.

Quando encarada com a mínima (mínima mesmo!) seriedade que merece, a trama traça a veia cômica do gênero barato do clássico. Não existem grandes furos que preocupem ou condicionamentos que precarizem os personagens mais antigos. Tudo se barateia tanto quanto não se leva a sério. Essa proporcionalidade acaba transformando a sequência do clássico em fiel, direta e nem um pouco mesquinha com o seu público. Tudo é dado de bom grado, até a própria finalização ordinária já imaginada desde o seu princípio. O longa não apela para reviravoltas absurdas ou conclusões que não façam sentido além do esperado pelo espectador ou pelo nostálgico dentro da sala de cinema. Ver cada uma dessas etapas acontecendo na tela, por outro lado, é revigorante para os quatro anos de espera pelo bom slasher com os maneirismos trazidos pelo torpe boneco.

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O longa segue com a ideia de multiplicar o terror compreendendo Chucky em todas as suas formas, personalidades e imprevisibilidades dentro do recluso lugar. As várias versões do boneco com pequenas variações comportamentais ajudam a criar (acredite ou não) bons diálogos para o alívio cômico do roteiro. A seriedade bem trazida pela atuação de Nica (Fiona Dourif) chega a abrir a possibilidade da trama resgatar um suspense há muito perdido em gradualidade desde os primeiros filmes do boneco. Quem acompanha desde o princípio ou maratona de uma vez a saga passa a compreender que enquanto o estilo se perdeu para se reinventar, também se destruiu para se recriar. Não demorou muito para a própria faca, nostálgica como ela é, sumisse dentro das possibilidades que surgiram.

Seja pela recordação ou pela curiosidade, O Culto de Chucky é um bom entretenimento final para qualquer bom apreciador do slasher contemporâneo que não tira os pés do cinema despreocupado de sua era de ouro. A duração costumeira do filme não é quebrada e o saldo de mortes continua alto. Esqueça os muitos bonecos neste novo filme. O retrato violento aqui chega pelas margens do chocante, não exatamente do banho de sangue gratuito herdado das outras obras. O longa do boneco assassino ainda é a primeira escolha para uma reunião nostálgica dos amigos ou de uma lista de reprodução para o Dia das Bruxas. Chucky nunca esteve tão diferente, afiado e criativo.