Crítica | Jogo Entre Amigos (Buddy Games) [2019]

Nota do Filme:

É comum, após uma experiência ruim envolvendo o Cinema, algumas pessoas falarem “perdi uma hora e meia da minha vida vendo esse filme”, ou “aquele filme me tirou duas horas que eu nunca mais vou recuperar” etc. Embora sejam apenas figuras de linguagem, devo dizer que particularmente evito utilizar expressões desse tipo, uma vez que considero que toda investida cinematográfica, incluindo as mais desagradáveis, podem acrescentar algo, seja para aprender a identificar com mais facilidade elementos – estilísticos ou narrativos – negativos, seja para saber o que deve ser evitado. No entanto, vez ou outra (na minha vivência isso costuma acontecer de duas a três vezes por ano), surge na nossa frente uma obra tão estúpida em absolutamente todos os seus aspectos que é praticamente impossível tirar dela qualquer tipo de lição, abrindo precedentes para que as frases acima sejam interpretadas ao pé da letra. O que eu passei assistindo a Jogo Entre Amigos foi tão embaraçoso que o mínimo que poderia ser feito seria agredir esta bomba com algumas palavras em retribuição à agressão audiovisual que ela provoca, e assim dizer que vê-la pelo menos contribuiu para que eu exercitasse minha escrita.

Nem sei se vale a pena mencionar a sinopse, considerando que nada faz sentido e basta dizer que você vai passar noventa e seis minutos acompanhando pessoas idiotas fazendo coisas idiotas e esperando que você ache graça disso ao invés de perceber que se cortar com papel talvez seja mais divertido do que continuar assistindo. Mas vamos lá. Bobfather (Josh Duhamel, e eu não acredito que acabei de escrever a palavra Bobfather), Durfy (Dax Shepard, marido de Kristen Bell, o que me leva à conclusão de que ela o ama muito, pois é difícil continuar um casamento depois disso), Doc (Kevin Dillon, irmão mais novo de Matt Dillon, pobre Matt), Bender (Nick Swardson), Zane (James Roday Rodriguez) e Shelly (Dan Bakkedhal) são homens adultos que se recusam a crescer e organizam anualmente uma gincana no intuito de manter entre eles a broderagem e a “necessidade primitiva de dominar”. Palavras do roteiro, não minhas.

Ignorando completamente a noção de que é possível criar histórias divertidas sobre adultos obcecados por vitórias e que exibem um espírito juvenil enquanto estreitam laços de amizade (só para citar exemplos bem-sucedidos lançados recentemente, temos Te Peguei! e A Noite do Jogo, ambos lançados em 2018), essa avalanche de mau gosto reúne com êxito personagens detestáveis, uma ideia de humor extraída diretamente da quinta série e uma espécie de moral da história estapafúrdia que constantemente subestima a inteligência alheia. A proeza é tamanha que, perto dessa calamidade repugnante, Gente Grande se torna um clássico.

Em determinado momento, Bobfather (olha esse apelido, minha gente) quer saber por que sua companheira, Tiffany (Olivia Munn, por que você aceitou passar por isso?), “odeia tanto esses caras”. Poderia ser um instante de ironia, mas o roteiro jamais passaria perto disso, ele realmente não entende. Se o comportamento dos personagens de, digamos, American Pie, ao menos era condizente com o de adolescentes tapados, tudo muda de figura quando vemos marmanjões reproduzindo visões de mundo que geralmente são abandonadas no Ensino Médio, com um agravante: no caso de Stifler e sua turma, o filme sabia o que havia de errado com aqueles garotos e escancarava para que o público risse deles. Jogo Entre Amigos não. Jogo Entre Amigos glorifica uma série de comportamentos tóxicos e acredita que amizade nada mais é do que um culto ao bros before hoes.

Os momentos de “””humor”””, como é ridiculamente fácil de imaginar em casos assim, consistem em tentativas de criar gags grosseiras, nojentas, desconfortáveis e repulsivas, enfim, as formas mais rasteiras de buscar produzir comicidade, porque as mentes geniais responsáveis por essa babaquice acham que basta criar cenas envolvendo sêmen, fezes e órgãos genitais para fazer os outros rirem. Previsível ao extremo. Em outro momento, é como se o filme basicamente nos dissesse “Ei, olha lá, uma pessoa velha transando! Isso não é engraçado? Vamos rir do corpo dela!“. E é claro, É CLARO, que não poderiam faltar “””brincadeiras””” acerca da sexualidade de determinado personagem. Porque, você sabe, esse é um dos alicerces de uma amizade saudável.

A previsibilidade é tanta que antes da metade eu já imaginava que a produção incluiria erros de gravação durante os créditos finais, porque esse costuma ser um artifício óbvio de realizadores que não acreditam no próprio sucesso. Porém eles são tão incompetentes que até essa parte é tola, mas pelo menos é coerente com o todo, indicando que até o processo de criação desse filme não teve graça.

Trata-se do primeiro longa dirigido por Duhamel, o que pelo menos serve de alívio, já que é bom saber que ele não tem outros trabalhos por aí que possam cruzar o caminho de pobres desavisados. Que daqui para a frente ele se contente apenas em atuar (ofício no qual é mediano, diga-se de passagem), e nunca mais volte a comandar qualquer produção que seja. Ou que pelo menos faça uma série de cursos básicos sobre linguagem cinematográfica e – mais urgente ainda – passe por sessões de terapia para resolver todas as questões que possui envolvendo conceitos como amizade, comédia, relacionamentos e masculinidade, antes de ousar voltar a ficar atrás das câmeras e proporcionar novamente tamanho constrangimento.