Crítica | Infiltrado na Klan (BlacKkKlansman) [2018]

Nota do filme:

Infiltrado na Klan acompanha a vida Ron Stallworth (John David Washington), primeiro detetive negro do Departamento de Polícia de Colorado Springs. Determinado a provar o seu valor como policial, responde a um anúncio da Ku Klux Klan no jornal e, com a ajuda de Flip Zimmerman (Adam Driver) – que comparece fisicamente aos encontros –, se infiltra na organização.

Dirigido pelo conhecido Spike Lee, o longa é baseado em fatos reais, e utiliza o livro Black Klansman, escrito pelo próprio Ron Stallworth, como base. Nesse sentido, por mais que, nos Estados Unidos, a segregação racial por força de lei tenha começado a cair por terra em 1954, por meio da famosa decisão judicial Brown v. Board of Education, fato é que, ainda na década de 70, havia no país um forte movimento por direitos civis por parte da população negra.

Desse modo, tendo em vista o cenário político pelo qual passa o país, tem-se que Infiltrado na Klan é um filme necessário. Isto é, um dos méritos da história é mostrar que, por mais que, como sociedade, tenhamos evoluído consideravelmente, ainda há um longo caminho a ser percorrido.

Uma vez que trata de fatos históricos, é evidente que há certa alteração, de modo a fornecer um “aspecto de roteiro” mais apropriado. Todavia, tal ocorrência de forma alguma pode ser visto de maneira negativa, uma vez que se trata de uma clara necessidade de adaptação, posto que, do contrário, a experiência cinematográfica estaria comprometida. Assim, elogia-se o trabalho de Spike Lee, uma vez que, ao tomar certas liberdades narrativas, criou tons diferenciados na obra, de forma que há maior fluidez no conto, com transições naturais entre o drama e a comédia.

Imprescindível destacar o quão impactante é o final do longa. Com o gancho trazido pela história de Ron Stallworth, o diretor aproveita a oportunidade para ser tão incisivo quanto possível em sua crítica aos movimentos supremacistas brancos que, hoje, voltam a ganhar força no país.

Esse trabalho é complementado por ótimas atuações, sobretudo de seu protagonista. John David Washington mostra que não irá se limitar à sombra de seu pai[1] e conseguirá, em um futuro próximo, trilhar o seu próprio caminho na indústria do cinema. Adam Driver é responsável por grande parte da tensão do conto, uma vez que é quem, efetivamente, se encontra com membros dessa organização sobre a qual não havia, até então, tantas informações. Ressalta-se, inclusive, que a química entre os dois é excelente, de modo que a amizade dos personagens é um dos pontos altos da história.

Laura Harrier interpreta Patrice Dumas, jovem militante e presidente do Grêmio Estudantil Negro de sua faculdade. A despeito do pouco tempo de tela da atriz, possui um magnetismo natural, que sempre atrai a atenção do espectador. Por fim, destaca-se o trabalho dos atores Jasper Pääkkönen, Topher Grace[2], Ashlie Atkinson e Ryan Eggold, responsáveis por dar vida aos membros da organização, uma vez que, certamente, não é fácil interpretar pessoas com crenças tão distorcidas.

Todavia, por mais que se tenha, aqui, uma obra com muita qualidade e digna atenção, conta com as suas falhas. Isto é, por mais que, via de regra, ocorra uma boa transição entre os diferentes tons tratados no longa, por vezes, ocorrem cenas desconexas, que não dialogam de maneira natural com o momento no qual estão inseridas, quebrando a imersão do espectador. Ainda, tem-se que o tempo de duração (2h15min) é maior do que deveria, tornando a experiência um tanto quanto cansativa.

De qualquer forma, Infiltrado na Klan se mantém como um filmes mais relevantes do ano. Spike Lee impressiona com a retratação da trajetória de Ron Stallworth na conhecida organização Ku Klux Klan. Nesse sentido, tendo em vista o atual cenário político, tem-se como imprescindível que se traga uma lembrança do passado, para que possamos evitar os mesmos erros.


Filme visto durante o 20º Festival do Rio, em novembro de 2018

[1] John David Washington é filho do famoso ator Denzel Washington.

[2] O ator afirmou que a experiência afetou a sua vida pessoal no decorrer das filmagens, e descreveu como perturbador perceber que, ainda hoje, a ideologia de seu personagem, David Duke, ainda afeta o país no momento.