Crítica | Duna (Dune) [2021]

Nota do filme:

SONHOS SÃO MENSAGENS DAS PROFUNDEZAS.

ATENÇÃO: Esta crítica pode conter spoilers.

Baseado no livro de ficção científica mais vendido no mundo, Duna conta a história de uma civilização ambientada no ano de 10.191, e o enredo gira em torno principalmente do planeta Arrakis. Começamos conhecendo a civilização dos Harkonnen, que explorou Arrakis por muito tempo, até que o Decreto Imperial ordenou que eles se retirassem e fossem substituídos pela civilização dos Artreides.

O que parecia à primeira vista como uma punição aos Harkonnen e uma predileção pelos Arrakis, acaba se mostrando um verdadeiro “presente de grego” para os novos escolhidos. Assim, a civilização que vivia no planeta Caladan se muda para Arrakis para explorar aquele planeta desértico e tão traiçoeiro.

Apesar da escassez de água, o planeta conta com uma joia rara: as especiarias. O uso das especiarias que são extraídas das Dunas de Arrakis proporcionam a expansão da mente, permitem viagens intergalácticas e podem aumentar o tempo de vida daqueles que a consomem, o que explica o monopólio de sua extração, controlada pelo Imperador. Os efeitos das especiarias variam de pessoa para pessoa, podendo causar vícios insuperáveis ou mesmo transformar fisicamente os usuários. Um dos efeitos mais comuns é a mudança da cor dos olhos, que se tornam azuis.

A colheita das especiarias é uma atividade de altíssimo risco, já que os protetores das dunas são vermes gigantes que atacam quando detectam qualquer sinal repetitivo que se propaga na areia. Para se protegerem dos vermes, os habitantes tiveram que desenvolver os mais diversos artifícios, não só para conseguir colher as especiarias, como também para se deslocar entre um ponto e outro das dunas. As técnicas foram difundidas para outras gerações, e foram alvo de estudo aprofundado de Paul antes e durante a mudança.

Conforme os Atreides se adaptavam à nova realidade, conhecemos um pouco da personalidade do Duque Leto Atreides (Oscar Isaac), um líder justo e admirado por seus súditos, de sua companheira Lady Jessica (Rebecca Ferguson), uma bene gesserit muito poderosa, e do filho deles, Paul Atreides (Thimothée Chalamet), um jovem promissor, porém ainda muito inocente.

A família Atreides possui um exército fiel, com destaque para Duncan Idaho (Jason Momoa) e Gurney Halleck (Josh Brolin), que lideram os soldados e Paul, treinando-os diariamente. É importante destacar que o diretor tomou grandes liberdades criativas na adaptação deste trecho do enredo, já que o personagem de Jason Momoa possui muito mais destaque na adaptação do que na obra original, o que funcionou na prática devido à fama e destaque do ator, que, sem dúvidas, chama muito a atenção do público.

Conforme nos aprofundamos na trama, percebemos a importância indiscutível dos poderes em desenvolvimento de Paul, que busca controla-los a todo custo com ajuda da mãe, mas ainda peca em aspectos básicos de seus treinamentos por pura imaturidade, cenário este que muda rapidamente conforme os conflitos políticos tomam forma.

Os sonhos de Paul, além de denunciarem um grande poder em desenvolvimento, também nos mostram o que está por vir na inevitável continuação do filme, que já está em produção. Os sonhos assombram-no de forma constante e são sempre muito vívidos, e acabam se revelando, enfim, como verdadeiras visões de um futuro muito próximo.

As visões são apenas uma das tantas forças que Paul possui graças à mãe, Lady Jessica, uma das mais influentes bene gesserits, que treina o filho à risca para que desenvolva de forma responsável os seus poderes; Paul treina diariamente as habilidades com sua mãe, com foco principal em ler as pessoas de forma rápida e precisa e, claro, no uso da sua Voz de comando.

As bene gesserits são um grupo de mulheres muito influentes e detentoras de um poder distinto, queaguardam o cumprimento de uma profecia há séculos, em que um dia chegaria O escolhido. Lady Jessica teme que Paul seja, enfim, O escolhido, e seu temor tem origem nos grandes conflitos e traições que a família Atreides enfrenta ao longo da adaptação no planeta Arrakis.

O longa segue nesta linha, com a família Atreides no comando de um país cheio de armadilhas (algumas delas arquitetadas pelo Barão [Stellan Skarsgård]), lutando contra os Harkonnen, liderados por Glossu Rabban (Dave Bautista) e, claro, lidando com os tão temidos Fremen, civilização nativa de Arrakis. Não há dúvidas de que o espectador fica imerso pela ambientação criada por Villeneuve e, principalmente, pela trilha sonora composta pelo premiado e talentoso Hans Zimmer.

Ainda que a entrega tenha sido mais do que satisfatória, o longa também comporta críticas. Como grande fã do trabalho do diretor, criei grandes expectativas com o filme, as quais foram parcialmente superadas. Isto porque algumas decisões difíceis tiveram que ser tomadas no curso da adaptação do livro para os cinemas, de modo a deixar alguns pontos que considero importantes de lado, como, por exemplo, o aprofundamento da dinâmica das relações políticas, o que teria deixado a trama mais completa e até mais clara para quem não leu a obra original.

Ao mesmo tempo, devido à complexidade das relações, o diretor inevitavelmente precisava condensá-las de alguma forma, o que o levou a tomar as decisões artísticas que tomou (nada fáceis, diga-se de passagem). No fim, o saldo foi positivo, e acredito que este ponto ainda pode ser mais explorado na 2ª parte do longa, já confirmada pela Warner, que contemplará a 2ª parte do primeiro livro da série. A divisão da adaptação do primeiro livro em mais de uma parte foi uma das exigências de Villeneuve, que também é co-roteirista e grande fã da obra, e considera a concretização do projeto como um de seus maiores sonhos da vida realizado.

A versão aqui discutida não é a primeira adaptação para o audiovisual de Duna. O primeiro longa foi dirigido por David Linch em 1984. Após o fracasso cinematográfico enfrentado por Linch, foi produzida uma minissérie no ano de 2000, que foi mais bem recebida pelo público em geral do que o longa. Um ponto de destaque importante é que, em que pese tenhamos assistido uma versão adaptada que agrade o grande público somente em 2021, Duna influencia grandes obras de sci-fi há décadas (Star Wars é um grande exemplo!).

Vencedor de 6 Oscars e indicado a 10 categorias, Duna foi o maior vencedor da noite da premiação do ano de 2022, levando as categorias de Efeitos visuais, Trilha sonora original, Fotografia, Montagem, Direção de Arte e Som. A trilha sonora de Hans Zimmer trouxe a ambientação necessária para que o espectador conseguisse ficar completamente absorto naquele cenário árido de tanta luta, descobertas e traição. Duna é, sem dúvidas, uma obra-prima, e está disponível no streaming da HBO Max.