Crítica | Carros 3 (Cars 3) [2017]

Uma das mais rentáveis propriedades da Pixar, a franquia Carros sempre buscou a completa abertura criativa em seus roteiros e acabamentos. Corridas fanáticas, veículos bizarros, piadas prontas para o contexto e rotinas incrivelmente adaptadas na alegoria com carros. A produção muda, mas a execução não. Com o lançamento do terceiro filme, a presente trilogia surpreende ao não alcançar a conectividade esperada nem por público e nem por empresa. Sendo um modelo separado diferenciado dos dois títulos anteriores, a mudança na direção e o comprometimento em reavivar uma história de sucesso enquanto se redime de outra é claro. O terceiro filme não é só um fechamento temporário ou uma abertura para uma nova sequência, é sobretudo uma oportunidade de levar a franquia ao próximo nível de interesse do público.

Carros 3 começa com a promessa de retomar a identidade original do que o primeiro filme da franquia tentou trazer em sua conclusão. O desgaste com a apresentação de novos personagens é tão nociva quanto é na maioria das animações. O trato cômico que muitas vezes é avesso em melancolia apresenta a genialidade que só pode ser mostrada em filmes com esse caráter representativo. Não desbancando o trato único dado ao primeiro filme, a nova produção alcança o mais importante elemento para o seu ano de lançamento: a exclusividade. A história é o verdadeiro protagonista aqui. Existe nas piadas e nos próprios personagens, antigos ou novos, a óbvia convivência com um público que os assiste. No entanto, surge  do roteiro um final imprevisível com uma reviravolta emocionante, lembrando pelo que a franquia gritava em sua tímida fase inicial.

A realidade presente nos filmes da trama realça os nós com a nossa convivência humana de maneira única. Ainda que seja difícil encontrar um estranho ao Carros de 2006, familiarizar esta pessoa com o enredo e toda a alegoria de um vencedor não é muito difícil. O determinado e arrogante Relâmpago McQueen (Owen Wilson), ainda trava as mesmas batalhas com cenários diferentes. A ideia de vencer o inimigo interno e superar os externos de quebra é o que dá validade para o árduo treinamento de retorno do campeão mais jovem de uma Copa Pistão. E se o acidente apresentado no começo e nos trailers do terceiro filme não foi o suficiente para motivá-lo a isso, certamente as surpresas do meio da estrada irão.

Decalque é colocado em uma estrada em que não pode desacelerar. O seu retorno é marcado pela renovação e uma triste filtragem dos carros mais lentos e inaptos aos novos apetrechos tecnológicos que a grande indústria pode oferecer. Disputando contra Jackson Storm (Armie Hammer) e outros corredores equipados com o que há de ponta na elite dos circuitos em aparelhagem, Relâmpago se vê em uma incapacidade de se tornar o melhor, e caso o faça, se manter como tal.

Somos apresentados a um McQueen frágil, esgotado e perigosamente colocado na beira de uma inclinação que ameaça o puxar para sempre. A sequência mantém o clima de possibilidade nos personagens para qualquer coisa. Não se prendendo a uma jornada engessada, Carros 3 surpreende e muito em seus diálogos e na possibilidade nata de uma animação da Pixar vivenciar emoções humanas em tratos artificiais de uma animação equivocadamente categorizada pelo público adulto como sendo para o infantil.

Aproveitando ambientações fotográficas excelentes, o cenário criado para o terceiro filme é de tirar o fôlego nas passagens que acompanham sua trilha sonora original. Não esquecendo as corridas, viagens e visitações de McQueen a diversos circuitos, apresenta-se aqui uma única interpretação do que um retorno pode significar. A construção contida nos dois primeiros filmes auxilia o terceiro com um peso surpreendente. A protagonização de poucos novos personagens promete reticências de boa qualidade para a série. As pistas não duram muito sem McQueen, mas ele definitivamente não dura nada sem elas.