As novas caras da produção do gênero pós-apocalíptico têm tentado surpreender com o ambiente, mas não com o mesmo propósito. Uma grande produção é capaz de te sugar para dentro dela e forçar sua afinidade pelos personagens de uma maneira muito possessiva pelo tempo em tela. Histórias fechadas, como é o caso de Ao Cair da Noite, seguem o caminho da identificação: o mais sensível e escorregadio dessa categoria.
Essa reinvenção da modalidade do suspense e do terror vem se entrelaçando em algo muito saudável para a captura da simples, mas cativante história. A narrativa é tão fria e indiferente aos personagens que é quase possível sentir-se imerso naquele pequeno pedaço de chão. O espectador torna-se um hospedeiro silencioso da velha cabana. Não há uma grande intriga, grandes sustos ou apavorantes e angustiantes entradas do medonho desconhecido na tela. Quando tudo desaba, o filme desafia o espectador a piorá-la com o que verá em sucessão. A trama não se responsabiliza por explicar ou te questionar, ela apenas mostra e segue em frente. Essa falta de compromisso em agradar funcionou muito bem aqui.
Capturando do contexto mais recente, se A Bruxa (2015) capturou elementos já empoeirados do cinema cativo de mistério e deterioração do enredo em algo assombroso, aqui a manifestação acontece pelo motor já velho do drama pós-apocalíptico familiar. A trama escondida de um mundo devastado por uma misteriosa doença transmitida pelo ar e pelos animais não é aprofundada senão por algumas curtas passagens dos diálogos pelo assunto, o que não finda em uma somatória maior que cinco minutos de filme (com pausas). Não é essencial ou importante explicar, funciona deixar a brecha, mas momentos decisivos dos personagens usam do enredo omisso da doença para ter pesadelos e visões desencaixadas que contribuem para uma trama paralela e possivelmente real do que aquilo tudo se trata. No fim, a brecha do omisso dilata tanto que seria um alívio mostrar um pouco mais.
O elenco é o ponto alto aqui. A trama não se sustenta em pilares totalmente inéditos, mas com certeza foi bem projetada para servir naquelas cascas de personagens. Cada um representa um bastião do que o ser humano final naquela universo representa. Desconfiança, proteção, vontade, inocência, tudo é bem montado na composição final do núcleo de sobreviventes. É frustrante perceber que isso não se desenvolveu até onde poderia. Claramente houve um freio da direção ou do próprio roteirista depois das passagens de confraternização tão bem feitas e naturais e de alguns bons e penetrantes diálogos. É quase como se achassem que o filme já estaria bom o suficiente se obedecesse ao equilíbrio das colunas. Terror, drama e suspense nunca funcionam bem se dosados precisamente. Basta revisitar os clássicos para perceber que a desordem é o que enriquece histórias assim. Difícil é recordar um filme com os três aspectos que tenha obedecido à boa dosagem e ter mantido seu improvável impacto final.
A abertura do filme é muito interessante. A sacada de identificação com o personagem de Travis (Kelvin Harrison) acelerou a narrativa inicial. Logo esse recurso se perde, mas volta em algumas breves lembranças mais tarde. Bud (David Pendleton) não é realmente importante para a mecânica da narrativa em si, mas diretamente dita o comportamento inicial da família e isso ajuda o público a entender os personagens que sequer chegam a ser apresentados de forma limpa.
Se o espectador busca o cômodo assento do terror, o encontrará isso fechando os olhos para somente escutar. Trilha sonora e recursos de sonoplastia usados em momentos importantes onde os personagens lidam com a ameaça externa. Embora a ameaça não pareça realmente séria e sequer seja abordada com profundidade, o filme insiste em vender-se com essa ideia. O filme é rápido, direto e até bem previsível na sua conclusão.
Independente do gosto específico pelo gênero ou da forma como o filme promete abordá-los, vale a pena assisti-lo simplesmente pelas boas atuações e cenas em contextos muito bem feitos. A trilha sonora, como já dito, contribui e muito para amedrontar qualquer um, já que é forte, afiada e perturbadora, além de vultuosa. O ideal é só tentar compreender as motivações dos personagens e seguir com o mistério raso que apresentam na maior parte da duração do filme. Não pecaram na produção ou no polimento das cenas, você sente o real em cada segundo daquela duração. O filme tropeça e disfarça, mas também se arrisca em tentar acertar o novo como nenhum filme com formato parecido buscou tentar.