Crítica | An Cailín Ciúin (The Quiet Girl) [2022]

Nota do filme:

“Se há segredos numa casa, há vergonha nessa casa.”

Eibhlín Cinnsealach

The Quiet Girl segue Cáit (Catherine Clinch), uma jovem menina pertencente a uma família extremamente disfuncional. Com suas três irmãs, mais uma a nascer, é mandada para passar o verão com parentes distantes, Eibhlín Cinnsealach (Carrie Crowley) e Seán Cinnsealach (Andrew Bennett), tendo que se adaptar à nova vida.

Há muitos fatores “extracampo” que tornam essa uma obra indispensável em um ótimo ano para o Cinema. Baseado no livro “Foster”, de Claire Keegan, tornou-se a maior bilheteria da História de um longa irlandês sendo, inclusive, escolhido para representar o país na disputa de Melhor Filme Internacional de 2023.

Com uma narrativa lenta e comedida, The Quiet Girl pode, em um primeiro momento, parecer não fazer jus ao hype supracitado, todavia, é imprescindível não confundir complexidade desnecessária com qualidade. Trata-se, certamente, de uma história simples e direta, contudo, em sua simplicidade consegue trazer camadas interessantes que, outrora, não seriam possíveis.

Aqui temos uma dentre muitas representações de abuso infantil, mas, ao contrário de gritos e exageros – que, é claro, podem ocorrer em eventos do gênero e não os deslegitimam – há a introspecção. O modo como Cáit se retrai em si mesma carrega um quê de realismo que certamente irá reverberar com certas pessoas, ao mesmo tempo em que tocará – e, possivelmente, assustará – outras. Nesse sentido, toda a narrativa e produção contribuem para um conto intimista sobre uma jovem menina que não tem as ferramentas emocionais necessárias para lidar com a sua situação atual.

Sendo o caso, seria impossível não mencionar o belo trabalho técnico feito pelo diretor/roteirista Colm Bairéad na manutenção do ritmo lento da película, sem medo de manter a duração das cenas que, em outras mãos, poderiam se tornar “mais dinâmicas” meramente por capricho. Há um desconforto com o desenrolar da história que é necessário. Ao mesmo tempo, é bom lembrar, também, a contribuição de Kate McCullough, diretora de fotografia, em especial na escolha da proporção de tela 4:3, o que aumenta a sensação de imersão, quase como se fosse um vídeo caseiro. E, ainda, seria relapso não mencionar a atuação de Catherine Clinch que, em que pese a tenra idade – 12 anos à época de publicação deste texto – transmite, com sinceridade, as complexas emoções necessárias à obra.

Dessa forma, a catarse emocional do filme reside não necessariamente na vivência, por parte da audiência, de situações semelhantes – apesar de que a essas pessoas o efeito certamente será mais profundo –, mas sim em uma empatia humana natural. A conexão com uma jovem menina em uma situação tão complexa e de difícil resolução é quase que consequência natural do roteiro e trabalho de produção.

Nesse sentido, The Quiet Girl é o tipo de longa-metragem que atrai, no mínimo, a curiosidade de todos aqueles interessados na sétima arte, em especial considerando o quão diversa e, francamente, interessante, vem sendo a categoria de Melhor Filme Internacional. Pode-se ter alguns problemas com a execução, mas é quase impossível não se sentir ao menos um pouco emocionado com o resultado final.