Crítica | A Viagem de Chihiro (Sen to Chihiro no kamikakushi) [2001]

Imagem: Studio Ghibli / Divulgação

As animações ganharam um novo ponto de vista quando Hayao Miyazaki começou a fazer filmes, o Studio Ghibli é inventivo por usar os desenhos como ferramenta para criação de metáforas, essas são relevantes por realizarem uma crítica social, comumente usando crianças e sua forma de ver o mundo.

Unindo a fantasia e um estudo de sociedade, “A Viagem de Chihiro” fala sobre como as pessoas podem ser cruéis, ambiciosas e exageradas, e que se nós ajudarmos uns aos outros, esses defeitos podem ser sanados, basta usar a empatia e se perceber no lugar do outro.

Miyazaki conta a história de Chihiro, ela é uma menina que não queria se mudar, porém, devido aos pais, ela fez isso. Ao chegar a sua nova cidade, ela e a família descobrem um túnel e do outro lado deste, existe um local abandonado que ao escurecer, vira a morada de espíritos e de animais que trabalham para eles em uma casa de banho. Esse mundo é comandado por Yubaba, uma governante tirânica com todos.

Em suas duas horas de duração, vemos como o diretor é capaz de estruturar bem sua história, distribuindo os fatos de maneira igual, para que o público não fique perdido com o que acontece e muito menos se esqueça dos fatores criadores do enredo, é assim que se constroem as metáforas.

Porque, vejamos, os pais dela se tornaram porcos (isso faz parte dos primeiros 10 minutos de filme, logo, não se caracteriza como spoiler), pois eles pensaram apenas em si e na sua fome, e não na filha preocupada com o local onde estavam, da mesma forma que Yubaba serve como crítica aos diversos governos que nada dão ao povo e dele tudo tiram.

Mas a riqueza do filme está em como as pessoas afetam umas às outras, Chihiro afeta cada um ali que se permite ser atingido pela gentileza da menina. Lin, a companheira dela de trabalho, melhora como pessoa depois que viu como Chihiro não discriminou o Monstro do Mal Cheiro e o tratou como igual, Kamaji, o ajudante da casa de banhos e quem a faz funcionar, percebe como o sistema funciona contra ele depois que a menina mostra como ele é um patrão abusivo.

E mesmo que Yubaba não aparente ter mudado, essa mudança aconteceu, pois Chihiro, na sua inocência, a fez perceber como ela é uma mãe ruim, ou seja, mesmo que a bruxa não tenha mudado seu comportamento perante a casa da qual é dona, ao menos com o filho houve uma mudança de cenário.

Nada disso seria possível se Chihiro não tentasse ser gentil sempre, ela se colocou no lugar de cada um, inclusive no do Espirito Sem Face, esse por si só uma metáfora para os sentimentos escondidos de cada um de nós e da depressão que muitos de nós carregamos. Por aceitar esse espirito e não esconder isso de ninguém, ela une os seus próprios desejos com as mudanças que ela acha serem necessárias nos outros, talvez seja por isso que ela conquista cada um ali, mesmo que no inicio eles sejam hostis, graças a ela são reveladas as coisas boas daquela sociedade.

Um roteiro bem escrito é essencial para essa construção de metáforas, principalmente em um filme fantasioso como este. A fantasia poderia não ter nenhum sentido, assim como a realidade poderia ser perder dentro daquele universo, isso poderia tornar o filme bobo e maçante.

Graças a Miyazaki isso não acontece, ele é inteligente ao construir bem seu enredo, perspicaz ao estrutura-lo de forma a ter a duração certa e brilhante ao criar um universo tão fantasioso e real ao mesmo tempo, tornando a obra tocante em diversos momentos. Assim, “A Viagem de Chihiro” é uma viagem de fato, de identidade, de personalidade, de caráter e de amor.