Nota do filme:
Na intenção de ser um suspense diferente dos que já vimos por aí, À Espreita do Mal termina reunindo um punhado de boas ideias e juntando-as num mesmo filme para não correr o risco de perder ninguém. Fãs de sobrenatural, found footage (filmagens caseiras), drama familiar, vingança e suspense policial podem se sentir contemplados porque este é para todos os gostos. O problema é que, na maioria das vezes, quando queremos falar de tudo terminamos não falando de nada e, apesar de conseguir se manter interessante e equilibrado na maior parte do tempo, À Espreita do Mal sente os efeitos dessa mistureba.
A história começa mostrando o dia a dia de uma família e alguns acontecimentos aparentemente sobrenaturais que acontecem na casa onde moram. Jackie (Helen Hunt) e Greg (Jon Tenney) são casados, mas enfrentam uma crise que tem abalado muito seu filho Connor (Judah Lewis). A presença mordaz que habita a casa começa a se tornar cada vez mais perigosa e certos acontecimentos ameaçam seus moradores a ponto de faze-los tomar decisões drásticas para enfrentar essa onda de horror.
Em meio a tantos tramas diferentes, o maior desafio de À Espreita do Mal é conectá-las de um jeito que não pareça tão forçado. O diretor Adam Randall trabalha bem e faz o seu melhor para criar tensão e sustentar o grande plot o máximo que consegue. Sua direção até usa alguns recursos interessantes, mas está longe de ser criativa como a de Aneesh Chaganty, por exemplo, responsável por Fuja, o último sucesso da Netflix. Mas a trilha sonora aparece em cena justamente para preencher essas lacunas e termina sendo uma das maiores responsáveis por nos manter com os olhos grudados na tela.
(Alerta de spoiler!)
Porém não só ela. A artimanha principal do filme é fisgar o espectador com um plot twist em cima do outro, justamente para conectar as temáticas e justificar os demais acontecimentos da trama. De longe, a reviravolta mais inusitada é a primeira delas, que acontece ainda no começo da história: por meio de cenas no estilo found footage, descobrimos que não existe nada de sobrenatural nos acontecimentos estranhos, mas, sim, dois jovens que se infiltram na casa e terminam pregando algumas peças nos moradores. Essa atividade é conhecida como phrogging e seria aparentemente inofensiva se outros acontecimentos não estivessem por trás dos objetivos de um dos invasores.
Se a intenção era nos fazer de trouxa, À Espreita do Mal consegue isso de uma forma muito eficiente. Tanto direção quanto edição fazem o espectador se iludir muito fácil, odiando um personagem e logo em seguida odiando outro com mais naturalidade do que o roteiro permite. Isso por quê, pela quantidade de temas que o filme aborda, ele acaba não conseguindo desenvolvê-los o suficiente para nos fazer comprar tantas reviravoltas. Elas até fazem sentido, mas tantas questões mal trabalhadas resultam numa dificuldade grande em conectar todos os pontos sem parecer forçado.
É então que ele se torna tão sutil quanto um elefante numa loja de artigos de porcelana. O filme sabe sobre o que quer falar e prega peças no espectador, o que acaba contando vários pontos, mas são muitas as subtramas mal desenvolvidas. O drama familiar é deixado completamente de lado (assim como certos personagens), o grande vilão não tem tempo nem espaço suficiente para desenvolver sua história e o desfecho acaba sendo apressado demais para conseguir acomodar tudo sem esforço aparente.
É verdade que o “menos é mais” não é nenhuma regra, mas, se aplicado em determinadas situações, pode ser de grande ajuda. À Espreita do Mal teria sido um desses exemplos. Suas reviravoltas são todas bem-vindas, mas a que custo? É um filme intrigante, com boas ideias e desdobramentos que funcionam, mas se perde em diversos arcos subdesenvolvidos e desnecessários. Fazer esse enorme elefante se acomodar numa trama que busca ser mais direta e menos complexa não é nada fácil, por isso algum foco teria lhe feito muito bem.
Jornalista viciada em recomendar filmes e revisora de textos recifense que vive escrevendo sobre cinema nas horas vagas.