Crítica | A Chegada (Arrival) [2016]

Nota do Filme :

Com um roteiro baseado no conto “História da sua Vida”, de Ted Chiang, A Chegada retrata a tentativa estadunidense de estabelecer contato com uma das doze naves alienígenas que estacionaram em diversos pontos do mundo.

A linguista Louise Banks (Amy Adams) é recrutada pelas Forças Armadas dos EUA para trabalhar em conjunto com uma equipe de especialistas de diversas áreas que tentam entender o motivo da chegada das naves.

Com a ajuda de Ian Donnelly (Jeremy Renner), um físico teórico, Louise vai nos fundamentos da linguística para estabelecer contato com os dois seres alienígenas, que eles apelidam de Abbott e Costello (referência à famosa dupla de comediantes dos EUA).

Embora o pano de fundo do filme seja a invasão alienígena, isto em nada define a trama, visto que os pontos chave de toda a narrativa são a comunicação e o tempo. O filme traz reflexões sobre o modo como nos comunicamos uns com os outros, a forma como lidamos com conflitos e com situações extremas.

Aviso ao leitor: a partir deste ponto da crítica, analisaremos o enredo de forma mais aprofundada, ou seja, terão alguns spoilers no texto. Caso ainda não tenha assistido, recomendo que assista sem mais nenhuma informação prévia. Ah! Depois não esqueça de voltar aqui para continuar lendo, hein? Aí poderemos discutir juntos todas as pulgas atrás da orelha que este filme nos deixa (e são muitas!).

Logo no início do filme, somos apresentados a uma mulher que sofreu a perda de sua filha e vive um luto. Por não sabermos (ainda) que o filme é não-linear, nos deixamos influenciar por essa informação, e acreditamos que a apatia da personagem nos frames seguintes é consequência de suas experiências traumáticas.

Contudo, conforme a trama se desenvolve, fica evidente o incômodo de Louise ao pensar na filha, o que, até então, parecia ser apenas uma lembrança dolorosa. Com a modificação da percepção de espaço-tempo provocada pela compreensão da nova linguagem, entendemos que a personagem passou a perceber o tempo não mais como algo estático, periodizado e imutável, e sim como algo fluido e único. Portanto, as imagens que acompanhamos não são do passado, e sim do futuro, o que explica a confusão de Louise.

Nesse momento, é possível que o espectador comece a colocar em xeque todas as experiências até então mostradas como flashbacks. Quando finalmente entendemos que tanto a língua dos heptapods quanto o filme são circulares, sem início ou fim, abrimos espaço para uma reflexão trazida pela personagem de Amy Adams: Se visse sua vida toda, do começo ao fim, você mudaria alguma coisa?”.

Outra reflexão importante que a personagem traz é sobre suas memórias com a filha. Tanto o começo, quanto o meio, e também o fim, têm a mesma importância. Até o nome escolhido para a filha, Hannah, é um palíndromo, ou seja, lê-se igual de trás para frente, trazendo a sensação de infinitude, de atemporalidade.

Essa parte do filme me transportou imediatamente para Dark, série da Netflix, onde a temática do espaço-tempo e o seu determinismo também são abordados. Até que ponto temos poder sobre o que acontece conosco?

Se temos, de fato, o poder da escolha, viveríamos a mesma vida se soubéssemos o que nos aguarda lá na frente? Tanto para o filme quanto para a série, tudo já aconteceu, já existe e não há poder de escolha.

O enredo ainda reforça a problemática da má comunicação quando mostra a pressa da equipe estratégica em entender os motivos da Chegada, bem como as tentativas de cooperação frustradas entre os países, causadas, primordialmente, pela falta de comunicação.

Outro ponto bastante discutido é: afinal, o que é a arma? Entendo que a arma fornecida pela civilização alienígena é a habilidade de perceber o tempo de forma não-linear, conquistada ao aprender a linguagem dos heptapods, de modo que passado, presente e futuro se apresentam da mesma forma, acessíveis e influenciáveis entre si.

O aprendizado dessa nova linguagem modifica a forma como a humanidade se comunica. Caso a civilização humana continuasse não se entendendo, não haveria como a civilização alienígena ser salva no futuro, e, por isso, para eles é importante que a raça humana domine a sua linguagem e desenvolva as habilidades necessárias para se entenderem e não se dizimarem.

Com 8 indicações ao Oscar, A Chegada é considerada uma das melhores ficções científicas da atualidade, e é um dos meus filmes preferidos. O próximo filme do diretor Denis Villeneuve, Duna, estreia ainda em 2021, com data prevista para 1º de outubro, pela plataforma de streaming HBO MAX.