A Coreia do Sul subiu no conceito dos brasileiros após a participação na Copa do Mundo de 2018 por ter vencido a algoz brasileira, Alemanha, pelo placar de 2 x 0, eliminando os alemães da competição na primeira fase e, de brinde, deixando-os em ultimo colocado do grupo classificatório, não tendo um gosto de vingança direta por parte dos brasileiros, assunto este que um dos maiores diretores sul-coreanos da atualidade, Park Chan-wook domina de forma magistral.
Porém nem só de Chan-wook vive o cinema sul-coreano, apesar de ele ser um dos nomes mais importantes do cenário cinematográfico, a Coreia do Sul possui uma gama de excelentes diretores na atual conjuntura, sempre se destacando em festivais e produzindo obras que conseguem revigorar as técnicas de direção e narrativas, criando uma alternativa a Hollywood para filmes de ação. Contudo, apesar de viver uma ótima fase hoje, os primórdios do cinema sul-coreano são infelizes devida a sua formação histórica como nação.
Para fins de contextualização, o território em que se localizam as duas Coreias foi invadido e anexado pelo Japão em 1910, perdurando a tomada até 1945, com o fim da Segunda Guerra Mundial, na qual o território coreano foi dividido entre a União Soviética (Coreia do Norte) e Estados Unidos (Coreia do Sul), e apenas após o fim da Guerra da Coreia, o cinema sul-coreano obteve uma oportunidade para crescer, sendo um dos temas mais recorrentes de suas obras a liberdade, por conta de toda sua história trágica de formação como Estado. Apesar disso, o primeiro filme que se tem registro no país se chama “The Righteous Revenge”, de 1919, dirigido por Kim Do-san.
E, durante o período pós-Segunda Guerra e pré-Guerra da Coreia, o primeiro e mais importante filme produzido pela nação sul-coreana se chama “Viva Freedom!”, de 1946, dirigido por Choi In-kyu, sendo que o diretor desse filme possuía um certo nível de permissão do governo japonês para realizar filmes durante a época de dominação nipônica, mas nada com a relevância e a liberdade desse longa citado anteriormente. Para explicar a situação durante a Guerra da Coreia, durante os anos de 1950 e 1953, o governo sul-coreano produziu apenas 14 filmes.
Todavia, o cinema sul-coreano começa a viver um período de ouro cinematográfico após o fim da Guerra da Coreia, aumentando exponencialmente sua produção de filmes, como por exemplo, chegando a produzir 111 longas no ano de 1959. E, um dos filmes mais importantes dessa época, “Madame Freedom”, de 1956, dirigido por Han Hyung-mo, se tornou uma das obras mais populares do período.
Nessa fase o país se distinguia pela quantidade de melodramas realizados, que era o gênero predominante entre a maioria das obras. Alguns diretores então decidiram experimentar cada vez mais, aproveitando a falta de censura estatal, o que resultou em alguns dos maiores filmes da história do país: “The Housemaid”, de 1960, dirigido por Kim-Ki Young e “Obaltan”, de 1961, dirigido por Yu Hyun-mok. No entanto, em 1962, o governo sul-coreano passou a ter mais controle sobre as produções cinematográficas, fazendo com que os diretores encontrassem formas alternativas para realizar suas obras, na qual um dos filmes dessa época acabou ganhando sucesso, se tornando o maior trabalho da carreira do diretor: “Mist”, de 1967, dirigido por Kim Soo-yong.
Em 1973 é criada a Korean Motion Picture Promotion Corporation, uma organização para fomentar o desenvolvimento do cinema nacional, contudo acabou tendo fins políticos, servindo para o Estado produzir filmes sobre seus valores, crenças e princípios para a população em geral. Um exemplo de como esse episódio afetou o país em larga escala foi quando o governo sul-coreano revogou a licença do diretor Shin Shang-ok em 1975, acabando com diretor sendo sequestrado pela Coreia do Norte em 1978. Nesse período se destacam dois filmes: “Yeong-ja’s Heydays”, de 1975, e “Winter Women”, de 1977, ambos dirigidos por Kim Ho-sun.
O país começaria a acertar o rumo de suas mudanças em 1984, quando foi aprovada a “Lei do Cinema” permitindo que cineastas independentes produzissem seus filmes, e, com a revisão da lei feita em 1986, permitindo a importação de filmes para o país. E essas mudanças produziram efeitos imediatos, fazendo com que a atriz do filme “The Surrogate Woman”, Kang Soo-yeon, recebesse o prêmio de Melhor Atuação no Festival de Veneza de 1987. E em 1992 é lançado o filme “Marriage Story”, dirigido por Kim Ui-seok, porém com um diferencial crucial para o fomento do cinema nacional: esse longa foi lançado pela Samsung, abrindo assim uma porta em que as grandes empresas passaram a financiar filmes.
Apesar disso, com a crise asiática de 1997, muitas empresas pararam de realizar esse financiamento para os cineastas, contudo o resultado dessa ausência foi contrário. Pelo terreno cinematográfico estar formado, muitos diretores conseguiram driblar esse desequilíbrio devido aos investimentos anteriores em jovens talentos, criando assim um novo cinema coreano. Nesse contexto que surgem os talentos sul-coreanos que acabaram ganhando espaço no mercado internacional do cinema, sendo premiados em diversos festivais como: Park Chan-wook, Kim Ki-duk, Bong Joon-ho, Hong Sang-soo. E, dando margem para a produção de novos longas inovadores sobre temas já batidos, como foi o recente “Train to Busan”, de 2016, de Yeon Sang-ho, que trouxe um frescor para os filmes com a temática zumbi.
Sendo assim, além dos filmes já citados anteriormente, vale sempre a pena conferir a riqueza que é esse cinema sul-coreano, seja pelo refresco que eles trazem com temas recorrentes ou pelas cenas de ações com objetos inusitados, é evidente que esse país possui um dos cinemas mais agradáveis e extraordinários de se assistir na atualidade, além de fugir totalmente do abismo de Hollywood, sem projeções de parar de crescer, apenas se consolidando como um dos grandes cinemas da atualidade.
ABAIXO UMA LISTA DE FILMES PARA CONHECER AINDA MAIS O CINEMA COREANO
- A Criada, 2016, Dir.: Park Chan-wook
- Eu vi o diabo, 2010, Dir.: Kim Jee-woon
- Oldboy, 2003, Dir.: Park Chan-wook
- Novo Mundo, 2013, Dir.: Park Hoon-jung
- Lugar Certo, História Errada, 2015, Dir.: Hong Sang-soo
- Memórias de um assassino, 2003, Dir.: Bong Joon-ho
- Casa Vazia, 2004, Dir.: Kim Ki-duk
Apaixonado por cinema, amante das ciências humanas, apreciador de bebidas baratas, mergulhador de fossa existencial e dependente da melancolia humana.