Crítica | Ave, César! (Hail, Caesar!) (2016)

Nota do Filme:

Joel e Ethan Coen são, sem dúvida nenhuma, dois dos diretores mais influentes e reconhecidos do cenário cinematográfico contemporâneo. A dupla detém uma legião de fãs e admiradores que reconhecem a inventividade e a originalidade de suas obras, que sempre se destacam pelo humor próprio e pelas histórias criativas e personagens marcantes. A dupla é responsável por obras consagrados como: O Grande Lebowski (1998), filme que conta com um dos personagens mais excêntricos do cinema, o “Cara”, e que inspirou a criação da religião/filosofia autointitulada de “Dudeismo”, que conta com mais de 450 mil “sacerdotes ordenados” por todo o planeta; Fargo (1996), uma comédia de humor negro baseada em erros e situações inusitadas que, anos depois, ganhou uma série que carrega o mesmo nome; e, Onde os Fracos Não Tem Vez (2006), filme que conta a história do assassino Anton Chigurh, um dos maiores vilões da história do cinema, segundo a revista Empire.

Em Ave, César! (Hail, Caesar!), a dupla conta uma história que transita entre diversos gêneros e reforça, de maneira clara, a identidade cinematográfica de ambos diretores. A obra é uma comédia de humor negro, com traços de musical e com elementos de histórias épicas e dos clássicos filmes noir. Uma mistura que flutua entre os gêneros de forma orgânica e cômica, com um ritmo delicioso e acessível ao público.

Eddie Mannix (Josh Brolin) é o administrador da Capitol Pictures, um estúdio cinematográfico responsável pela produção dos principais filmes da época. Sua missão principal é manter suas estrelas na linha, além de cuidar para que suas vidas extra-tela não ultrapassem o limite do aceitável e do “bem visto” para a década de 50, época em que se passa a história. Para completar, ele precisa ponderar uma proposta de emprego que lhe foi oferecida, e lhe garantirá uma estabilidade vitalícia, além de um cargo de gerência muito mais tranquilo do que o que mantém atualmente. Durante a produção de seu mais novo filme que contará a história de Jesus Cristo, de seu aparecimento para as pessoas até a sua crucificação, Mannix se vê obrigado a tratar do sequestro repentino de seu protagonista – uma das principais estrelas do estúdio – Baird Whitlock (George Clooney).

O filme conta com um elenco estrelado e talentoso, que parece se divertir genuinamente na retratação de seus caricatos personagens. Ralph Fiennes, Scarlett Johansson, Tilda Swinton, Channing Tatum, Frances McDormand e Jonah Hill, são exemplos do casting caprichado apresentado pela película. Além deles, Alden Ehrenreich e Heather Goldenhersh despontam como talentosas e engraçadas surpresas.

Com relação à forma, o filme apresenta uma estrutura dividida em dois núcleos que dialogam entre si a partir do uso (um pouco injustificado) de um narrador (Michael Gambon). O primeiro núcleo trata dos desafios vividos diariamente por Mannix e conta com boas e contemporâneas sacadas sobre a própria indústria cinematográfica: um ator de faroeste que não sabe “atuar” em um filme de drama – debate sempre presente quando um ator de comédia se aventura em outro gênero, por exemplo; e a sempre viva indagação: “Quando todos tiverem TV, ainda haverá público no cinema?” – problema vivido hoje pelo embate Netflix x Cinema. No outro lado, temos o núcleo do personagem raptado, vivido por Clooney. Aqui, a história é ainda mais curiosa por se tratar de um inesperado debate ideológico e filosófico entre o capitalismo e o comunismo – sempre usando a sétima arte como plano de fundo.

A recriação do ambiente de um filme dos anos 50 é sublime. A fotografia, os figurinos e a trilha sonora são criadas de forma a parecer que, de fato, estamos assistindo a uma obra da “era de ouro de Hollywood”. Prova disso é a indicação ao Oscar e ao BAFTA na categoria de Design de Produção.

Ave, César! é um filme dos irmãos Coen, e só isso já é um argumento forte o suficiente para garantir a sua qualidade. Seu ritmo preciso e a forma com que a história é contada e representada, só transformam a experiência em algo muito mais agradável e prazeroso para o público em geral. Apesar de, ao final, parecer necessitar de um conflito maior, a obra figura com propriedade, entre os melhores filmes já dirigidos pela consagrada dupla.