Nota do filme:
Os padrões de beleza que a sociedade impõe, principalmente para a mulher, são um tanto quanto errados, já que não fazem as pessoas se sentirem bem com elas mesmas, construindo uma luta quase infinita para se adequar dentro do que é exigido em relação a corpo, rosto, inteligência e a vários outros aspectos.
Talvez, Georges Franju, diretor de “Os Olhos sem Rosto” (1960), tenha pensado em fazer uma crítica em relação a isso. Com uma história angustiante, mesmo para os padrões atuais, acompanhamos Genessier (Pierre Brasseur), um médico que estuda transplantes de rosto. Após sua filha Christiane (Edith Scob), ficar com o seu rosto deformado devido a um acidente de carro, ele e Louise (Alida Valli), sua secretária, sequestram mulheres para que possam retirar os rostos delas e colocarem em Christiane.
É interessante como o filme, logo de cara, estabelece bem seus personagens e a crítica aos padrões que pretende fazer, usando a câmera para fazer o público prestar muita atenção em cada rosto, para memoriza-lo e pensar que o rosto visto, pode ser o próximo alvo de uma tentativa de transplante forçado. Fora que a forma como a obra estabelece o perfil buscado por Genessier para realizar a operação, fica exposta logo de cara: ele quer uma mulher que seja mais bonita que a filha, para que ela, como o próprio diz em certo momento, possa recomeçar sua vida.
Esses rostos são sempre o de mulheres loiras e de olhos claros, ou seja, um dos padrões de beleza estabelecidos na época, logo, Genessier procura “melhorar” a aparência das pessoas, de forma a perpetuar um padrão, ao invés de quebrar o sistema de beleza e o fato de os transplantes, ao longo do filme, não terem sucesso, é um dos pontos que expõe como o personagem está errado naquilo que busca.
Mas, claro, além disso ser um ponto, ele comete crimes para realizar tal objetivo, ou seja, Franju cria um personagem que não tem nada de bom, para sintetizar em uma pessoa, como se fosse uma espécie de metonímia, os padrões que nos são impostos a cada dia, estabelecendo uma reflexão interessante, ao assistir o filme, sobre o porque da imposição de um padrão.
A mensagem que o diretor quis passar, sobreviveu ao tempo, assim como o estilo de filmagem, que usa muitos ângulos contra plongee (enquadramento de baixo para cima), para expor os personagens – principalmente Genessier – como se fosse uma figura superior a todos aqueles que estão a sua volta e a máscara utilizada por Christiane, além de ser uma referência a época impressionista e naturalista do cinema francês, foi usada por Pedro Almodóvar no filme “A Pele que Habito” de 2011, mas, em “Os Olhos sem Rosto”, o peso e a simbologia que a máscara carrega, são diferentes do filme mais recente.
Portanto, “Os Olhos sem Rosto” continua sendo um filme atual, já que traz uma mensagem que ainda persiste, mas, felizmente, as qualidades do filme, como sua história envolvente, personagens interessantes e bem construídos, também são atuais e servem como referência a vários outros trabalhos.
Formado em Jornalismo e apaixonado por cinema desde pequeno, decido fazer dele uma profissão quando assisti pela primeira vez a trilogia “O Poderoso Chefão” do Coppola. Meu diretor preferido é Ingmar Bergman, minhas críticas saem regularmente aqui e no assimfalouvictor.com