Nota do Filme:
Como já é de praxe, o cinema costuma buscar inspirações em basicamente tudo que o cerca. São incontáveis as obras inspiradas em livros, peças e até mesmo em músicas. Porém, existe um categoria que costuma ser mais desafiadora para os diretores da sétima arte: filmes baseados em jogos de vídeo-game. Por algum motivo, a transposição entre mídias costuma ser complicada tanto no quesito história, como no campo visual. A alta exigência e o número de fãs dos jogos clássicos, que costumam ser os escolhidos para virar filme, pode ser uma das muitas tentativas de explicação para esse insucesso de crítica e, muitas vezes, de bilheteria. Exemplos recentes, como o péssimo Assassin’s Creed (2016) e o também não muito querido, Warcraft: O Primeiro Encontro de Dois Mundos (2016), comprovaram essa tese acabando com a esperança de que algo poderia mudar nesse cenário.
No ano de 2018, mais uma tentativa foi realizada. Baseado em uma das personagens mais clássicas dos games, Tomb Raider (2018) foi uma tentativa de reboot lançado para apagar o fracasso dos filmes passados. Anteriormente, a história da aventureira Lara Croft já havia sido interpretada em duas oportunidades pela atriz Angelina Jolie. Mesmo com um certo sucesso nas bilheterias mundo afora, os filmes Lara Croft: Tomb Raider (2001) e Lara Croft: Tomb Raider – A Origem da Vida (2003) sofreram com uma enxurrada de comentários negativos por parte dos jogadores fiéis da franquia e da crítica cinematográfica especializada. Curiosamente, nos vídeo-games, um reboot também foi realizado. Em 2013, o jogo que deu nome ao filme, surgiu para recontar a vida da heroína nas plataformas da geração passada do Xbox e do Playstation. Contudo, essa “mudança de ares” não aconteceu pelo mesmo motivo que a das telonas. A história foi recontada para tentar angariar mais público jovem e novos jogadores, que se atraíram pelos gráficos impressionantes e que exploravam ao máximo as capacidades dos consoles da época.
Lara Croft (Alicia Vikander) é a independente filha única de um aventureiro (Dominic West) que desapareceu anos atrás. Vivendo de maneira precária e sempre atrás de algum “bico” para ganhar dinheiro, a jovem se recusa a receber a herança de seu progenitor pelo fato de não aceitar que ele está morto. Após encontrar uma gravação que explica o destino e a motivação do desaparecimento de seu pai, Lara decide embarcar em uma perigosa jornada pelo mar japonês à procura de respostas. O destino: um túmulo lendário de uma “deusa” nipônica, conhecida como Himiko, ou rainha, localizado em uma mítica e isolada ilha. Porém, a aventura será muito mais difícil do que parece.
Dirigido pelo norueguês Roar Uthaug, a obra marcou a sua estreia no cinema norte-americano. A fonte de inspiração para o filme, obviamente, foi o jogo de 2013. Porém, o diretor pareceu não se importar nem um pouco em contar praticamente a mesma narrativa, utilizar os mesmo recursos visuais (em quesito de locação e cenas específicas), além de aproveitar a mecânica do jogo para aumentar exponencialmente o sofrimento da protagonista, algo que conferiu realismo ao game e à película e os diferenciou das histórias anteriores. Contudo, uma melhoria tem que ser reconhecida: ambas as obras retiraram a hiper sexualização da personagem, que vestia trajes curtos e que marcavam seu corpo em praticamente todas as cenas das obras anteriores. Aqui, o que importa são os feitos de Lara, e não quanto o seu corpo pode ser atraente para o público em questão.
A escolha de seguir o roteiro do jogo quase ao pé da letra acabou sendo maléfica para a experiência. Clichês que funcionam no mundo dos vídeo-games são malvistos na indústria do cinema. O desenvolvimento da história e as decisões tomadas por certos personagens são pautadas por coincidências que chegam a beirar o ridículo. A chegada de Lara e o desconhecimento dos funcionários da recepção da empresa de seu pai a seu respeito é algo que já foi representado, de maneira idêntica, em uma dezena de filmes. Inclusive, quem assistiu à horrenda série da Netflix, Punho de Aço (2017), sabe muito bem do que eu estou falando. A personagem chega a soltar a expressão: “Sério?” em uma cena que traz uma decisão completamente sem sentido de um dos personagens. Para não se limitar ao jogo original, o filme também se inspira (muito mais do que deveria) nos filmes clássicos do gênero aventura. Uma das cenas do terceiro ato de Tomb Raider parece, e muito, com Indiana Jones e a Última Cruzada (1989), escancarando a falta de criatividade do diretor.
Entretanto, a escolha de Alicia Vikander como protagonista é um dos maiores trunfos da futura série de filmes – sim, o final de Tomb Raider (2018) deixa claro que esse é o primeiro de muitos, então se prepare. A atriz vencedora do Oscar de coadjuvante pelo filme A Garota Dinamarquesa (2015) traz um fôlego novo à história. O seu comprometimento com a atuação fizeram com que praticamente todas as cenas de ação fossem feitas por ela própria e não por uma dublê. Fora isso, é inegável o abismo de qualidade interpretativa de Alicia com relação ao restante do elenco de apoio. Vale lembrar que a atriz também fez parte do excelente filme de ficção, Ex-Machina (2014).
No geral, Tomb Raider é um bom filme de ação e aventura, mas com um roteiro péssimo, com uma duração maior do que deveria e alguns efeitos especiais bastante contestáveis. Mesmo assim, Alicia Vikander traz novos ares à franquia com mais uma boa atuação, o que dá certas esperanças para as futuras continuações. Enquanto isso, ficaremos no aguardo de uma nova tentativa de se fazer um bom filme inspirado em um game.