O terror é um gênero raramente lembrado em premiações de cinema. Muito se deve aos clichês e temas repetitivos. É um nicho que persiste em reciclar – seja em direção ou roteiro – ideias desgastadas. No entanto, o movimento vem em acensão nos últimos anos, muito por conta do chamado pós-terror, onde a técnica do jump scare é jogada de lado e a temática é priorizada. Como exemplo, é pertinente citar A Bruxa (2015), Corrente do Mal (2014), Ao Cair da Noite (2017) e Corra! (vencedor de Melhor Roteiro Original no Oscar 2018). Muitas vezes cercado por um teor psicológico, o estilo consegue harmonizar a tensão com textos reflexivos, indo além de sustos e mortes brutais. Esse é o caso de The Invitation, da diretora Karyn Kusama.
Lançado em 2015, o longa independente direciona seu olhar para seitas de auto ajuda. Após um trágico acidente com o filho, um casal se divorcia e cada um tenta construir uma nova vida. Dois anos depois, a ex-esposa (a atriz Tammy Blanchard), agora com um novo namorado, convida Will (o ator Logan Marshall-Green), o ex-marido, para uma festa na antiga casa dos dois. Acompanhado de sua nova namorada, ele aceita o convite e vai para reunião, onde também estão presentes amigos do antigo casal. Após algum tempo no local, os anfitriões anunciam que participam de uma seita secreta, que promete eliminar o sofrimento humano. Desconfiado do comportamento da ex-mulher e de seu novo companheiro, Will teme que algo está por acontecer. Ele estaria certo ou é tudo invenção de sua cabeça?
Embora tenha dirigido Garota Infernal (2009), neste longa a cineasta conduz um plot muito mais tenso e maduro. Não há alívio cômico como em seu trabalho anterior. Aqui impera a tensão e uma pitada de melodrama. A trilha sonora, composta por Theodore Shapiro, é um dos artifícios que mais sustenta a linha de tensão. Ao longo dos 100 minutos de filme, o som é dominado por notas ásperas de um violino, anunciando que algo está por vir. Já o papel da direção é pôr à prova a sanidade do protagonista, como na cena do espelho do banheiro, que alerta para um conflito interno no personagem. Além disso, alguns planos nos colocam no lugar de Will, ao mostrar os demais convidados encarando a tela, na mesma medida em que o encaram com olhar julgador.
O primeiro ato da trama, embora rígido desde a primeira cena, consegue explicar a razão da presença de cada um dos convidados. Há o médico cético, o brincalhão descontraído, a introvertida, a amiga com o namorado desaparecido (que serve como pista de que algo pode estar errado) e o mentor da seita. Até a sua conclusão, todos vão se relacionando por diálogos orgânicos. Já o protagonista inicia uma busca por uma verdade que imagina estar escondida, através da percepção de detalhes que vão somando em sua teoria de conspiração, como a porta trancada, as grades na janela e a falta de sinal nos telefones. E esse suspense já chega engatilhado para o primeiro ponto de virada, quando fica evidente a anormalidade dos donos da casa após colocarem um vídeo para todos assistirem.
A segunda parte – a mais arrastada das três -, é corajosa ao construir lentamente o clímax, contrapondo flashbacks com o mistério principal, mas sem perder o objetivo central. Os retornos ao passado inclusive ajudam a montar a dúvida sobre a saúde mental do protagonista. Will ora parece estar certo, ora parece estar errado. Assim, conseguimos chegar ao grand finale sem certeza de nada.
Quando surge o último ato, o ritmo do longa acelera gravemente. Todas as interrogações são respondidas de maneira saudável. Entretanto, embora seja o mais movimentado, é também o momento em que o roteiro tropeça um pouco. Mesmo tratando-se de um longa bem inovador do gênero, acaba caindo em certos clichês, como a famosa confissão de um personagem enquanto agoniza e espera pela morte.
Apesar de algumas pequenas derrapadas no final (pequenas mesmo), The Invitation é um excelente exemplo de terror psicológico. Produzido com orçamento baixo (apenas 1 milhão de dólares), o longa prova que o gênero não precisa de muito investimento para inovar na categoria. Além disso, o tema dialoga diretamente com as seitas presentes em Hollywood, como a cientologia. Vale conferir.
Obs: até março de 2018, o filme estava no catálogo da Netflix.