Nota do Filme:
Dizer adeus é sempre difícil. Ninguém gosta de abandonar algo ou alguém contra a sua vontade, independentemente do motivo ser de força maior. O que resta é aproveitar esses momentos finais, mesmo que apenas uma das partes saiba que o desfecho é inevitável.
“Quando a família de uma doce senhora descobre que ela possui apenas mais algumas semanas de vida, eles decidem não informá-la a respeito do diagnóstico. Em vez disso, seus filhos e netos tentam arranjar um casamento de última hora para que todos os parentes mais distantes possam vê-la por uma última vez sem que ninguém saiba o que está acontecendo de verdade.”
Lulu Wang, em seu segundo longa, disseca um conto sobre família, utilizando uma ótica intimista e pessoal, além de realista, discorrendo sobre a perda, ou o sentimento que antecede o inevitável sabido por todos, de forma a valorizar os últimos momentos.
Para isso, o roteiro, que também é assinado pela diretora, aborda temas complexos como diferenças culturais de regionalidade, origem do indivíduo, vínculos familiares e o luto, desenvolvendo todos eles completamente, o que cria a catarse da audiência para com os personagens. Ainda, a intensidade da abordagem do tema é ratificada pela perspicácia dos diálogos, não evitando o conflito em nenhum momento, pelo contrário, sendo os embates dos personagens sobre a questão principal aquilo que faz a narrativa caminhar.
Além disso, a direção de Wang reafirma a potência sentimental do texto, que, ao optar por planos longos e com poucos cortes, deixa o drama familiar mais autêntico e natural, ainda que a diretora por vezes utilize outros movimentos de câmera mais perceptíveis como travellings. E, por ser uma direção mais sutil, a genialidade está nos pequenos momentos, como quando a diretora abre mais um plano ou dá closes no rosto dos personagens, principalmente na interpretada por Awkwafina , em que a câmera sempre busca destacá-la a fim de demonstrar o que ela sente ou o isolamento impetrado pela situação.
No mais, é necessário destacar a performance de Awkwafina que, por conta do estilo adotado pela diretora, é espontânea e carismática, tornando-se uma das atrizes promissoras a se olhar no futuro. Contudo, o grande destaque das atuações vai para Zhao Shuzhen como a matriarca da família que está para falecer, na qual o texto a coloca como contraponto por conta da blindagem da família face à sua situação, mas que entrega uma atuação enérgica e sincera, sendo impossível não se simpatizar com ela.
Com isso, a fotografia possui um papel importante na criação da dualidade, além de desenhar os opostos das duas personagens acima que, aliada da direção de arte, utiliza o azul para criar a atmosfera de desolação, além de, conforme o filme avança na narrativa, intensifica os tons , tornando-o mais escuros, demonstrando o aumento desse sentimento. Ainda, emprega cores brancas e cinzas para criar a neutralidade ou apatia frente a situação, mas que contrasta com os outros elementos, como a própria direção de arte e figurino. Vale ressaltar também que a opção pelo formato widescreen favorece os planos panorâmicos da diretora, que são vistosos pela competência da fotografia.
Portanto, The Farewell é uma das ótimas surpresas de 2019, além de apresentar Lulu Wang para um público maior, bem como Awkwafina , demonstrando que é possível reinventar narrativas que abordam o luto, não caindo em pieguismos ou sensacionalismos baratos, mas sim com sinceridade e maturidade pois, apesar da dificuldade de aceitar a despedida da pessoa, é algo que todos estão fadados sofrer. Como já dizia Leandro e Leonardo “não aprendi dizer adeus, mas tenho que aceitar”, só demonstra que, apesar de tudo, o tempo cura tudo.
Apaixonado por cinema, amante das ciências humanas, apreciador de bebidas baratas, mergulhador de fossa existencial e dependente da melancolia humana.