Crítica | Pig: A Vingança (Pig) [2021]

Nota do filme:

Não dá para dizer que a carreira de Nicolas Cage se tornou uma piada da noite para o dia, sem motivo nenhum. Durante boa parte dos últimos vinte anos, o ator aceitou participar de filmes absolutamente rasos e esquecíveis para pagar dívidas astronômicas, sem falar que, muitas vezes, suas atuações deixaram de ser apenas operantes e se tornaram caricatas e bem ruins. Nos acostumamos tanto a ver Cage dentro do personagem que ele mesmo criou para si que esquecemos do ótimo ator que sempre esteve escondido lá, aquele que recebeu um Oscar em 1995 por Despedida em Las Vegas, por exemplo.

Aos poucos, ele vem se lançando em projetos pequenos e cada vez mais interessantes por permitirem que o público vislumbre o Cage que, nos anos 90, alcançou seu auge. Eis que chega ao Brasil pelo streaming da Telecine o filme Pig: A Vingança, de premissa simples e direção minimalista, mas belamente arrebatador em cada detalhe, sendo a atuação de Nicolas Cage o maior de todos eles.

Pig conta a história de Rob (Cage), um homem solitário cuja única companheira é uma porquinha caçadora de trufas. Ele mora numa pequena cabana no meio da floresta do Oregon e sobrevive da venda das trufas que colhe entre as árvores para grandes restaurantes de Portland. Certo dia, sua casa é arrombada e sua porquinha, sequestrada. Ele então se vê obrigado a deixar a pacata rotina para voltar à cidade e procurar sua companheira custe o que custar.

Nicolas Cage em cena de Pig.

Logo no trailer, Pig já deixa bem claro que o espectador não deve esperar por um novo John Wick. Mas se, mesmo assim, ele continuar com essa expectativa, é certeza de que terá uma experiência frustrante, não apenas porque Pig tem pouco do filme protagonizado por Keanu Reeves, mas porque ele vai perder a chance de se surpreender e se maravilhar com a sensibilidade dessa história. A direção de Michael Sarnoski, que acerta no tom melancólico da trama, brinca o tempo todo com a expectativa do público. Pig reúne elementos de suspense, ação e do filme de vingança, mas, no fim das contas, se mostra um drama de reflexões profundas que surpreende o espectador a todo momento.

O desenvolvimento lento pode incomodar, mas é difícil soar como um defeito, pois é o tipo de filme onde sempre está acontecendo alguma coisa. A cada cena adentramos mais uma camada da casca, polida ou bruta, de seus personagens, todos cheios de subtextos muito ricos. Mas ao mesmo tempo em que direção e roteiro são muito hábeis em mostrar e desenvolver os traumas de cada um, fica a nosso cargo desvendar o que não está na superfície. Nesse trabalho de mostrar apenas o necessário, a edição também ganha destaque ao fazer com que o próprio espectador, de certa forma, continue a cena ele mesmo, desvendando a história e fazendo suas próprias considerações.

Contido em suas próprias reflexões existencialistas, é esperado (mas injusto) que Pig passe longe de ser um filme amplamente visto e comentado. Mas se por um lado ele está ciente da simplicidade de sua história, de outro é através dos superlativos que se sustenta. Afinal, o que vemos é uma fotografia belíssima, uma direção altamente competente e, sobretudo, uma interpretação espetacular. É possível que Rob esteja entre os três maiores personagens da carreira de Nicolas Cage. Com presença e muita propriedade, sua atuação soturna e melancólica é digna dos aplausos que, talvez pela reputação, ele não consiga receber. É injusto que uma interpretação tão sensível e meticulosa acabe sendo esnobada pelas premiações, mas o público que assistir à Pig: A Vingança não irá esquecer o retorno triunfal do grande Cage.