Nota do filme:
Em seu último lançamento, Sofia Coppola, que é a diretora de um dos meus filmes preferidos, Encontros e Desencontros, se juntou à Apple+ e aos Estúdios A24 para produzir uma comédia/drama boa o suficiente para preencher algumas horas do seu dia, mas que provavelmente não se tornará um de seus trabalhos mais marcantes. Em On The Rocks conhecemos Laura (Rashida Jones), uma escritora que está passando por um intenso bloqueio criativo. Inserida em um casamento com duas filhas pequenas e um marido com foco total no trabalho, ela tenta equilibrar a vida pessoal, o casamento e a criação das meninas, mas acaba deixando de lado uma das mais importantes áreas de sua vida: a profissional.
A vida em família é muito diferente da vida de solteira, mas claramente a mudança pesa muito mais sobre a mulher do que sobre o homem, e este filme deixa isso muito claro quando mostra Dean (Marlon Wayans) tocando sua vida profissional despreocupadamente, sem restrições de horários ou datas comemorativas, enquanto Laura dedica todo o seu tempo para a família, deixando as horas que “sobram” para se dedicar à sua carreira.
Em paralelo à sua vida de casada, Laura mantém uma relação atípica com seu pai, Felix (Bill Murray), um homem de meia-idade que usa suas influências para manipular todos à sua volta, inclusive sua filha, de modo que tudo saia conforme ele deseja. Fica evidente que essa postura por vezes a incomoda, mas, por não ter o pai sempre por perto, ela acaba relevando o seu jeito sedutor, que é aflorado perante qualquer mulher que cruze o caminho deles, em troca de algumas horas de distração.
Felix toma, então, um papel central na vida da filha quando ela começa a desconfiar das horas extras do marido, da falta de atenção com ela e do brusco distanciamento entre eles. Ele, que nunca achou o genro bom o suficiente para a filha, toma frente da situação, embarcando de mala e cuia nas paranoias dela, que, na verdade, só precisava ser escutada, e não ter suas inseguranças estimuladas.
O papel desempenhado por Bill Murray é o de um homem galanteador que beira o inconveniente, e que não tem mais espaço nos dias de hoje. A diretora consegue trazer o incômodo de um personagem que era muito comum nos filmes de antigamente, pela forma de tratar as mulheres (como se tudo o que elas quisessem fosse ser cantada por um homem), mas que hoje, felizmente, não é mais vista com bons olhos, e isso é demonstrado pelo claro incômodo da filha a cada vez que o pai a deixa ali, plantada, esperando que ele termine o seu flerte.
Os momentos reflexivos entre pai e filha me trouxeram certo conforto. Quando Felix se preocupou em trazer a realidade de sua vida para a filha, seus erros e acertos durante o tempo em que foi casado com a mãe dela, houve uma aproximação real e bonita entre eles, embora não sem dor. Crescer e ver que nossos pais são pessoas normais, que erram e acertam como nós, é uma quebra de expectativa que pode ser muito dolorosa, e por vezes essa transição é mais demorada para algumas pessoas. O destaque do filme, é claro, vai para os dois.
No que diz respeito ao casal, o que aconteceu entre marido e mulher, segundo o filme, foi um distanciamento corriqueiro, e não um sinal de que o casamento estava prestes a ruir. Esta parte do filme não me convenceu. Dean claramente não estava vendo Laura como mulher, e sim como mãe, durante todo o filme. É evidente que a perspectiva que assistimos era pelos olhos de Laura, uma narradora não confiável, mas, mesmo quando as coisas foram esclarecidas, a química entre eles não foi convincente e me deixou frustrada com o que eu estava assistindo.
On The Rocks é um filme que diverte e faz refletir, mas que poderia ter sido muito mais. Com um bom elenco, um ótimo estúdio e uma diretora com toda a expertise de Sofia, é triste dar uma nota que não seja 5 estrelas, mas os furos na trama são inegáveis e deixam espaços que são impossíveis de ignorar. De qualquer forma, não é um filme ruim, só não é ótimo como poderia ser. Para assisti-lo e tirar suas próprias conclusões, basta acessar a plataforma de streaming da Apple+.
Sou muitas em uma só. Como já dizia o Gato da Alice: We’re all mad here. 🙂