Nota do filme:
O cinema é fascinado pela máfia. Não é à toa que O Poderoso Chefão é considerada uma das maiores obras da história da sétima arte pela maioria dos críticos e cinéfilos. Contudo, apesar do gênero soar inesgotável devida a tantas ótimas narrativas produzidas sobre essa temática, nem todas conseguem se destacar pela trama, mesmo que o enredo seja promissor.
“Considerado um dos mafiosos mais relevantes na história da Itália, Tommaso Buscetta (Pierfrancesco Favino) foi também o principal informante da polícia em uma gigantesca operação que resultou em centenas de prisões que ajudaram a desmantelar a máfia italiana. Em meio a mortes, tráfico e ameaças, Tommaso viveu os dois extremos da lei e tornou-se conhecido por seus ex-companheiros como traidor.”
Marco Bellocchio, notório cineasta italiano, apresenta em O Traidor o seu conto de máfia com um dos casos mais emblemáticos de sua terra natal, demonstrando que, mesmo com um ótimo material em mãos, é possível fracassar e não alcançar todo o potencial possível. Isso ocorre porque o longa é um cabo de guerra no qual não há equilíbrio em seus elementos técnicos e narrativos, pecando pelo excesso.
Entretanto, inicialmente, esses componentes da linguagem cinematográfica são utilizados com êxito como, por exemplo, na montagem, que conta duas narrativas simultâneas sem atropelá-las entre si, além de dividir as cenas em capítulos de maneira didática com as datas dos acontecimentos, ou interpor momentos de delírios em meio à narrativa principal sem deixá-la sem nexo.
Entretanto, devido a essa edição o filme cai na própria armadilha ao impor um ritmo frenético no começo que se torna raso à medida que o tempo vai passando, pois, ao se propor em identificar os fatos históricos, não cria substância nem conteúdo, além de a montagem, eventualmente, deixar de parecer natural.
No mais, o único elemento narrativo constante é a fotografia, que trabalha com o azul, predominantemente, além de mais cores frias para dar contraste a melancolia, medo e solidão da vida escolhida pelo protagonista. E, mesmo quando há aplicação de tons mais quentes, o personagem principal continua sendo destacado com cores frias, demonstrando que sua condição não muda.
Em relação ao roteiro, ele é uma faca de dois gumes: ao mesmo tempo em que possui diálogos bem elaborados, principalmente em relação aos momentos no tribunal, não aprofunda os personagens, tornando-os esquecíveis pois não criam empatia com o público.
Sendo assim, não há grandes destaques individuais na atuação, além de contar com uma Maria Fernanda Cândido estereotipada pelo roteiro em seu elenco. A direção é convencional apesar de se arriscar com movimentos da Nouvelle Vague francesa. Sobre a trilha, homenageia Nino Rota de uma maneira estranha, ou talvez íntima demais.
Portanto, O Traidor se torna um dos filmes esquecíveis do gênero, apesar de possuir certas qualidades, pecando mais pelo excesso da forma que resolveu contar a história, e nem a curiosidade sobre o longa ter momentos que se passam no Brasil são suficientes para encantar a audiência, principalmente a brasileira.
Apaixonado por cinema, amante das ciências humanas, apreciador de bebidas baratas, mergulhador de fossa existencial e dependente da melancolia humana.