Nota do Filme:
A política americana é, sem sombra de dúvidas, um tema curioso. Explorado algumas vezes por séries como “House of Cards” e em filmes como “Todos os Homens do Presidente”, os americanos estão sempre pensando em tentar decifrar a democracia vigente no país por meio das ferramentas a seu dispor. O tema que o diretor Scott Z. Burns traz em “O Relatório” é recente e extremamente delicado. Para isso, ele conta com bom elenco e um roteiro bem acabado.
Daniel Jones (Adam Driver) é um funcionário do governo encarregado de fazer um relatório sobre os métodos de tortura da CIA no Oriente Médio após o 11 de setembro. Os segredos revelados agitam a Casa Branca e o Congresso, e muitos tentarão suprimir as verdades encontradas.
Poderia ser este mais um filme sobre política com ritmo lento, roteiro demasiadamente explicativo e previsível, mas “O Relatório” oferece uma visão superficialmente mais isenta sobre uma delicada questão: a agência de inteligência americana. É fato que isso deveria preocupar não apenas norte-americanos, mas todos nós, afinal, é sabido que a CIA também tem alguns olhos no Brasil. Apesar disso, a trama do filme foca no relatório de Daniel Jones, que investigou a agência em operações pós 11 de setembro.
Na tentativa desesperada de prever um próximo ataque terrorista a agência acabou se rendendo a questionáveis técnicas de tortura. Isso, obviamente, foi omitido do público e da mídia. A grande questão levantada pelo filme é: em nome da segurança nacional, tudo é permitido? Nesse sentido, o longa traz à tona uma preocupação mundial (ou ao menos das democracias) sobre o papel da inteligência e da obtenção de informações no sistema democrático moderno. Existem muitos casos recentes, e um dos mais famosos, o caso Snowden, é até mencionado no filme.
É se utilizando de uma trilha sonora repleta de violinos e notas graves de piano que o diretor Scott Burns desenrola a trama com cuidado, de modo a não entregar tudo ao espectador de uma só vez. Por vezes somos surpreendidos ao mesmo tempo que o protagonista, e a gravidade das descobertas criam uma tensão crescente no público. Visando resolvê-las, o diretor segue um caminho que pode parecer polêmico, mas isso será pessoalmente decidido pelo espectador.
Adam Driver está bem no papel, o que não significa muita coisa. Daniel Jones é um “zé-ninguém” que acaba por ser muito inteligente e perspicaz, e isso não abre muitas possibilidades para uma grande performance. Jon Hamm é uma boa adição ao elenco, interpretando o astuto senador Denis McDonough. Annette Bening age como o ponto de equilíbrio, ou o famoso pé-no-chão, de Daniel Jones, interpretando a senadora Dianne Feinstein. Pensando que o filme é baseado em fatos reais, as caracterizações funcionam bem, e as representações do senado e Casa Branca são ótimos complementos à história.
Um thriller político atual, que traz à tona uma discussão muito mais necessária do que pensamos, “O Relatório” funciona bem até seu desfecho ufanista, que pode desagradar parcela do público. Como retrato de uma história real, é urgente. Como obra cinematográfica, um pouco ultrapassada pela exaustão do gênero. Ainda assim, há espaço para esse filme e ele deve ser encarado como um produto de um embate político que não é local, mas que nos afeta diretamente.
Um sonhador, nascido no interior, que tentar por em palavras sua paixão pela arte.