Nota do Filme:
Nem sempre é simples escrever uma crítica de um curta-metragem. Características como o tempo reduzido e uma narrativa mais objetiva muitas vezes bloqueiam uma análise aprofundada, não fornecendo elementos suficientes a serem destrinchados em muitos parágrafos. Em outras palavras, é comum não haver muito o que dizer. Entretanto, vez por outra nos deparamos com obras que, embora diminutas em sua duração, apresentam múltiplos aspectos que encantam pela sensibilidade com a qual são expostos e pelo poder de síntese em abordar tanta coisa em pouco tempo. É o caso de Intervalo, uma aula sobre o poder do Cinema em dezesseis minutos.
O jovem Yacine (Ilies Kadri), acompanhado de dois amigos, quer desesperadamente assistir a Velozes & Furiosos 8, mas não tem dinheiro para o ingresso. Os três, então, passam a elaborar planos de penetrar na sessão tão desejada. Sem entrar em maiores detalhes, parte de um desses planos consiste em uma inesperada sessão de Ladrões de Bicicleta, clássico neorrealista italiano de 1948.
O modo como o diretor e roteirista Anthony Lemaitre constrói sua história, começando como uma comédia adolescente até chegar no poder transformador do Cinema, é inteligente, ágil e divertido, pavimentando com muita solidez o caminho para que nos emocionemos em seu encerramento. E que isso seja feito em menos de vinte minutos é ainda mais louvável.
Além disso, é impossível não nos identificarmos com o que é experimentado por Yacine. Todos que amamos a sétima arte em algum momento passamos pelo que ele passa, e – se tivermos sorte – ainda nos lembramos do exato dia em que o Cinema deixou de ser apenas mais uma fonte de entretenimento e se revelou diante de nós em todo o seu potencial. E poder testemunhar isso acontecendo e observar o início dessa paixão, ainda que perante um personagem ficcional, é sempre gratificante.
Também é importante sublinhar que Lemaitre não menospreza ou diminui a experiência vivida pelos amigos do protagonista, optando, em vez disso, por apresentá-la como igualmente legítima, uma vez que também é real e impactante. Pois Intervalo compreende que não se trata de hierarquizar produções artísticas, o que seria apenas um exercício de soberba, mas sim de destacar como elas impactam diferentemente cada pessoa.
O roteiro também é esperto ao incluir, ainda na primeira cena, um ponto que influenciará na reação do garoto no final, reforçando assim a ideia de que muito do que vemos na tela dialoga com nossas próprias vidas, e a maneira como nos relacionamos com os filmes é também uma forma de refletirmos sobre nossas existências. Pois essa é, afinal, uma das marcas mais fortes da Arte como um todo.
Historiador que acredita que a vida fica mais fácil quando vamos ao cinema.
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