Crítica | Encontros (Deux Moi) [2019]

Nota do Filme:

Classificar um filme pelo gênero nem sempre é uma tarefa fácil, principalmente quando, como ocorre em Encontros, a trama contém comédia e drama em uma história que não deixa de privilegiar, também, o amor como pano de fundo. Contudo, o sentimento citado aqui está mais para amor-próprio do que para o amor de casal. Encontros é isso, um longa difícil de rotular em apenas uma categoria. Alguns podem vê-lo como comédia romântica, outros como uma comédia dramática, mas se frustra quem assiste ao filme atrás de uma história de amor convencional.

O longa é, basicamente, dividido em duas faces: a história de Remy (François Civil) e a de Mélanie (Ana Girardot), dois vizinhos, que não se conhecem. Ambos vivem em Paris, mas não se mostra aqui a Cidade Luz com o ar romântico e glamouroso de costume. A capital francesa é retratada com uma atmosfera densa e vazia, onde domina o aspecto de solidão, típico de uma cidade grande qualquer. Os protagonistas, inseridos nesse ambiente, estão lidando com esse aspecto cada um à sua maneira. A ideia de clima pesado evidencia-se na fala de Remy, na passagem que diz algo como “o ar de Paris não é tão puro, mas ao menos lá, eu respiro”.

Mélanie dorme demais e não consegue superar uma desilusão amorosa, enquanto Remy sofre de insônia e tem dificuldade em expressar seus sentimentos. Ambos possuem uma sintonia palpável, mas percebida apenas pelo público, tendo em vista que eles ainda não sabem da existência do outro. Os dois atores convencem como jovens de cerca de 30 anos lidando com os problemas comuns da geração e entregam papéis contidos, mas que vão da comédia ao drama com facilidade. As conversas entre os psicoterapeutas e os protagonistas são bastante relevantes para o rumo da história e rendem bons momentos.

O destaque da produção é a direção de arte que fez um primoroso trabalho, mesclando cores quentes e frias nos personagens e nos objetos de modo a criar uma comunicação visual às cenas. Como exemplo, nota-se que as roupas de Remy são, na maioria das vezes, em tons azuis ou cinzas, enquanto os elementos ao seu redor convergem para cores quentes, como que simbolizando que algo muito bom está ali próximo, mas que ele ainda não consegue perceber. Já ao redor de Mélanie é possível ver as cores frias, que no caso podem indicar a proximidade de Remy, representado pelo azul. O mercado em que ambos fazem compras, local decisivo para um possível encontro, destaca-se pelas cores alegres e vibrantes, como amarelo e vermelho.

A direção de fotografia também contribui para deixar a obra mais acurada, com uma iluminação certeira, que agrega à narrativa. Cite-se a cena em que as amigas de Mélanie estão lhe ensinando a usar um aplicativo de encontro, momento em que os rostos das amigas estão iluminados pela luz exterior e apenas o dela está na penumbra, indicando que apenas ela está no “escuro”, enquanto as outras têm a “clareza”, sabem o que estão fazendo. A parte de som também não deixa a desejar. A sonoridade se associa bem à trama.

O longa não escapa do lugar-comum e possui algumas cenas desnecessárias, mas não impede muito a fluidez da narrativa. O roteiro é divertido e provocativo, na medida em que consegue despertar questionamentos a respeito da vida, das emoções cotidianas, dos objetivos pessoais e, ainda, transmite mensagem de superação e da busca pelo autoconhecimento. Passa, enfim, a ideia de que se deve confiar na vida e investir naquilo que se quer. Resume bem o conselho do psicoterapeuta de Remy (François Berléand): “Você tem o direito de viver. Você tem o direito de ser feliz”. Todo o filme é uma preparação para o que está por vir. É preciso, antes de amar alguém, amar a si mesmo.

Encontros estreia em 03 de outubro nos cinemas.

Direção: Cédric Klapisch | Roteiro: Cédric Klapisch | Ano: 2019 | Duração: 110 minutos | Elenco: François Civil, Ana Girardot, Rebecca Marder, Eye Haïdara, Paul Hamy, Camille Cottin, François Berléand, Pierre Niney.