Crítica | Ela Disse, Ele Disse (2019)

Nota do Filme:

É início do ano letivo e os estudantes da Escola Integrada Rebouças estão ansiosos para o primeiro dia de aula. Entre eles, Rosa (Duda Matte) e Léo (Marcos Bessa) possuem motivos adicionais para a ansiedade, pois são novatos no colégio. Prestes a iniciarem o curso, compartilham as expectativas que costumam surgir nesses momentos: serão aceitos?, farão amizades com facilidade?, se adaptarão ao novo ambiente?, conhecerão alguém especial? etc. As aulas começam e ambos rapidamente se dão bem, precisando, porém, lidar com os sentimentos que parecem florescer entre eles e com os antagonismos provocados pela diretora Madalena (Maria Clara Gueiros) e pelos colegas Julia (Maisa Silva) e Rafa (Matheus Lustosa). 

Baseado no livro homônimo de Thalita Rebouças, o roteiro escrito pela autora em parceria com Tati Ingrid Adão foca no universo adolescente e na vida escolar como espaço de projeção das inquietudes tão comuns nessa época. Nesse sentido, o projeto alcança bons triunfos aqui e tropeça acolá, alcançando um resultado irregular. Por um lado, por abordar dramas provavelmente já vividos pelo espectador (ou que estão sendo vividos, tendo em vista a faixa etária do público-alvo), uma ponte de entrada é criada com relativa facilidade; por outro, o longa comete um deslize comum em produções do gênero, isto é, retirar qualquer tridimensionalidade de muitos personagens, como se alunos do ensino médio não fossem dotados de profundidade. Assim, temos a turminha dos nerds, a patricinha fútil, as CDFs e os valentões.

Mais problemático ainda é o trabalho de montagem, que abusa dos cortes rápidos e quadros musicais, sendo um recurso narrativo pouco inspirado e fazendo com que o design de produção dos quartos dos protagonistas, por exemplo, seja mal explorado. Essa montagem faz com que o merchandising de uma determinada marca de tênis, aliás, não seja nada sutil. Outras escolhas, como a narração constante e o uso de letreiros deixam de contribuir e soam demasiadamente expositivos, como se duvidasse que o espectador conseguisse chegar a conclusões por conta própria (em certo momento, para que se note a presença de uma personagem em tela, o longa literalmente insere uma seta apontando para ela).

E já que é para falar em escolhas duvidosas, é no mínimo questionável a opção do filme em introduzir Rafa (o valentão) com uma trilha de rap tocando ao fundo, e Julia (a patricinha fútil) com funk, estabelecendo uma associação que apenas reproduz preconceitos já há muito tempo enraizados. E o que dizer do fato de que o único recurso cômico para ressaltar a pouca inteligência da garota é ter colegas a chamando de “burra” o tempo todo? Sem contar que a professora de português, Fátima (Bianca Andrade), supostamente o elemento “fofo” do corpo docente, faz questão de duvidar – perante uma sala de aula cheia – que sua aluna leia livros. Se essa é a professora fofa, pode-se se imaginar como é a malvada.

A irregularidade do roteiro encontra ecos no elenco. Se os intérpretes de Léo e Rafa são pouco expressivos e parecem ir à escola com sono, as responsáveis por Rosa e Julia encarnam com maior verossimilhança as emoções vividas por seus respectivos papéis, especialmente Maisa, que, dotada de carisma, faz com que sua personagem, embora maltratada pelo texto e a despeito dos esforços da obra, não se torne insuportável.No entanto, todos esses problemas elencados aparentemente desaparecem no ato final, que conta com mudanças e redenções nem um pouco orgânicas e que contradizem tudo o que havia sido construído até então. Isso faz de Ela Disse, Ele Disse um longa que procura ser fiel e honesto ao mundo adolescente, mas que não consegue evitar tropeços batidos e enxergar as armadilhas que deixa pelo caminho.