Quando pensamos em cinema sul-americano, a Argentina é o país do qual prontamente lembramos. Considerado por muitos o melhor e mais rico exemplar da sétima arte presente nas Américas (depois dos EUA, logicamente), as produções dos hermanos figuram constantemente em premiações internacionais e em listas de filmes obrigatórios criadas por cinéfilos de todo o globo. O desenvolvimento e o sucesso das produções locais podem ser explicados pela pronta assimilação dos filmes internacionais que impulsionaram e motivaram os aspirantes a diretores. Já no ano de 1896, os argentinos tiveram acesso ao filmes dos irmãos Lumiére – considerados por muitos os pais do cinema.
Desde o início do século XX, artistas da Argentina exploraram as possibilidades infinitas de “se fazer cinema”, criando curtas metragens e documentários pautados, inicialmente, pela história e pela literatura nacional. Durante as décadas de 30 e 50, o cinema argentino viveu a sua “Era de ouro” e retratou temas como o tango, o trabalho dos operários e a pobreza como algo enobrecedor, enaltecendo sempre as políticas econômica de Juan Perón, estadista da época e maior financiador do cinema local. Atualmente, as produções continuam a respeitar a sempre presente veia política e social de seu cinema, desenvolvida através do anos depois das turbulentas décadas de ditaduras e regimes totalitários do país.
Diferente do futebol, as produções cinematográficas da Argentina conquistaram, e ainda conquistam, constantes prêmios nos principais festivais da área. Quando o assunto é o Oscar, o país lidera o rankings do mais indicados da América do Sul de forma bastante ampla. Na categoria de melhor filme estrangeiro, são sete indicações com duas vitórias: A História Oficial (La Historia Oficial) (1985) e O Segredo de Seus Olhos (El Secreto de Sus Ojos) (2009). Já nas categorias individuais, os artistas argentinos também aparecem com frequência no prêmio. São 25 indicações e seis vitórias.
Nesse texto, que faz parte do especial do Cinematologia para a Copa do Mundo da Rússia, vamos procurar indicar alguns filmes, além de comentar sobre o principal diretor e o principal ator do país eliminado na fase de oitavas de final da competição. Vale lembrar que já fizemos uma lista com 5 indicações de filmes para conhecer o cinema Argentino.
Héctor Babenco (1946-2016)
Héctor Babenco foi um diretor muito conhecido em terras tupiniquins. Nascido em Buenos Aires, decidiu se mudar para São Paulo no final da década de 60, escolha que lhe motivou a se naturalizar brasileiro anos depois. Durante sua carreira dirigiu apenas 14 filmes, sendo muitos sucessos de crítica e público.
Certamente, o seu maior feito foi a indicação ao Oscar de melhor diretor no ano de 1985 com o filme O Beijo da Mulher Aranha (Kiss of the Spider Woman) – Babenco foi o primeiro latino-americano a concorrer ao prêmio mais importante do cinema. Além disso, teve a honra de dirigir estrelas do cinema internacional, como por exemplo, Jack Nicholson, Meryl Streep, William Hurt, John Lithgow, Tom Berenger, Kathy Bates, Willem Dafoe e Sônia Braga.
- Pixote, A Lei do Mais Fraco (1981)
- O Beijo da Mulher Aranha (Kiss of the Spider Woman) (1985)
- Ironweed (1987)
- Carandiru (2003)
- Meu Amigo Hindu (2015)
Ricardo Darín
É impossível falar de cinema argentino e não citar o nome de Ricardo Darín. Trabalhando no ramo da atuação desde pequeno, o artista já acumulou sucessos na televisão, no teatro e no cinema, como ator e diretor. Extremamente simples e sem grandes luxos, Darín cativa a todos com sua simpatia e paixão pelo cinema nacional. Por muitos anos chegou a recusar Hollywood, afirmando que a indústria americana retrata os latino-americanos de forma rasa e estereotipada, além de enfatizar que o dinheiro não é a única questão na vida de uma ator para se aceitar um determinado papel.
Em mais de 50 anos de carreira, já foi premiado em festivais da Argentina, França, Espanha, Cuba, EUA e Brasil. Confira alguns filmes de destaque da carreira de Ricardo Darín:
- Nove Rainhas (Nueve Reinas (2000)
- XXY (2007)
- O Segredo de Seus Olhos (El Secreto de Sus Ojos) (2009)
- Um Conto Chinês (Un Cuento Chino) (2011)
- Relatos Selvagens (Relatos Salvajes) (2014)
Como Funcionam Quase Todas as Coisas (Cómo Funcionan Casi Todas Las Cosas) (2015)
Celina (Verónica Gerez) foi abandonada por sua mãe anos depois de seu nascimento e hoje mora com o pai doente no interior da Argentina. Durante o dia, a jovem trabalha como caixa em um pedágio localizado em uma estrada quase deserta. Depois do expediente, canta em uma igreja local para conseguir mais alguns trocados. Alguns dias antes do Natal, seu pai comete suicídio. O fato acaba trazendo um certo espírito de mudança na vida da moça, que decide viajar para a cidade em busca de novas oportunidades de emprego. Quando surge a chance de se tornar vendedora, Celina começa a vender enciclopédias de porta em porta visando juntar dinheiro o bastante para comprar uma passagem para a Itália a fim de visitar sua mãe.
O longa é dirigido pelo estreante Fernando Salem e foi coroado com prêmios em festivais da Argentina e da Espanha, além de concorrer em competições do Uruguai e dos EUA. A história é simples assim como o desenvolvimento da película. Funcionando boa parte como um “road movie”, a experiência gira em torno de uma forte atuação central e de um andamento bastante paciente e surpreendentemente tocante. Mais uma mostra de que o cinema argentino pode retratar uma trajetória de vida de forma crua e competente.
O Cidadão Ilustre (El Ciudadano Ilustre) (2016)
A obra foi dirigida pela criativa dupla Mariano Cohn e Gastón Duprat, criadores do ótimo filme Querida Vou Comprar Cigarros e Já Volto (Querida, Voy a Comprar Cigarrillos y Vuelvo) (2011). O Cidadão Ilustre se mostra como um trabalho intimista, bucólico e autorreferencial, que começa com tons leves e engraçados e termina numa toada bastante tensa e reflexiva. O mais interessante aqui é observar a mudança de comportamento de seus conterrâneos durante a sua permanência no pacato vilarejo.
OBS: Até o lançamento desse texto, o filme se encontra no Netflix.