Vista por muitos como algo aquém dos tradicionais live-actions, a animação, de um modo geral, é vista como uma forma de arte infantil e, portanto, que não merece a devida atenção. Não à toa, até os dias de hoje há quem a entenda como um gênero em si mesma, tal qual “terror” ou “ação” o que, certamente, não possui qualquer fundamento.
Contudo, especialmente nas produções advindas do Japão, parece haver um certo preconceito, quase como se todas seguissem a fórmula estipulada por séries como Dragon Ball, Cavaleiros do Zodíaco e Yu Yu Hakusho. Não se trata de desmerecer esses verdadeiros clássicos, até mesmo porque foram pioneiros nessa “importação”, por meio da antiga TV Manchete, mas sim de lembrar que a cultura de um país, especialmente um multifacetado como o Japão, possui diversas maneiras de transmitir histórias e roteiros.
Dessa forma, pensamos em cinco filmes ideais para indicar aos interessados em perder esse pequeno preconceito que possuem com os longa metragens animados japoneses.
Princesa Mononoke – Dir. Hayao Miyazaki
Princesa Mononoke: Eu não tenho medo de morrer! Eu farei o que for preciso para tirar os humanos da floresta!
Impossível não falar sobre animações japonesas no Cinema e não mencionar Hayao Miyazaki. Os filmes do Studio Ghibli, criação de Miyazaki, Isao Takahata, Toshio Suzuki e Yasuyoshi Tokuma, ajudaram a moldar o modo como o Ocidente enxerga a mídia até os dias atuais.
Por mais que A Viagem de Chihiro seja, talvez, o longa mais emblemático, tanto do estúdio quanto do diretor, e, portanto, a sua não inclusão na presente lista talvez pareça estranha a alguns, a acessibilidade de Princesa Mononoke aos “não iniciados” faz da obra uma ótima introdução ao universo. A temática da narrativa, com foco na preservação ambiental e seu conflito com o progresso tecnológico, é perfeitamente relacionável a diversas outras culturas, com suas peculiaridades. Ao mesmo tempo, apresenta conflitos e pontos de vista que permanecem atuais até os dias de hoje, com personagens interessantes e tridimensionais.
Your Name – Dir. Makoto Shinkai
Mitsuha Miyamizu e Taki Tachibana: Esse sentimento me tomou, acho, desde aquele dia…aquele dia quando as estrelas caíram. Quase como…algo saído de um sonho. Nem mais nem menos…que uma vista espetacular.
Makoto Shinkai é um dos principais nomes das animações japonesas da atualidade, com seu último filme, O Tempo com Você, tendo sido a escolha do país para representar o Japão no Oscar do ano de 2019 (por mais que não tenha sido escolhido como uma das cinco opções na categoria de Melhor Filme Internacional). De toda forma, a mera escolha demonstra um alto respeito por parte da indústria do país para com o diretor.
Your Name conta a história de uma jovem que reside no interior do país e um jovem que mora na parte metropolitana de Tóquio. Os dois não se conhecem, mas, por algum motivo inexplicável, trocam de corpo. Mais “fixo” na realidade do que normalmente associado ao “gênero”, consegue absorver diversos aspectos da cultura japonesa, instigando o espectador a buscar mais sobre o país.
Perfect Blue – Dir. Satoshi Kon
Mima 2: Você é uma pobre coitada agora. Ninguém gosta de ídolos com reputações manchadas!
Estreia do Satoshi Kon na cadeira de diretor, Perfect Blue é um intenso thriller psicológico sobre uma artista pop japonesa que, após tentar sair de seu grupo musical, vê-se perseguida por fãs fanáticos insatisfeitos com a sua mudança de carreira. Ao mesmo tempo, começa a perder noção da própria realidade ao sentir uma cisão de sua personalidade, como se uma parte de si quisesse retornar ao mundo idol.
Tido por muitos como uma inspiração para Cisne Negro – o que parece justo, uma vez que Darren Aronofsky adquiriu os direitos autorais do filme para utilizar de imagens no filme Réquiem para um Sonho, de modo que certamente o conhecia –, Perfect Blue apresenta um terror existêncial profundo e complexo, que requer bastante atenção.
O filme criado por Kon nos traz um dos temores mais assustadores com o qual podemos nos deparar: a perda de identidade, aquilo pelo qual nos identificamos como indivíduos. Ao desafiar sua protagonista com a sua versão idealizada por terceiros, nos mostra o quão aterrorizante pode ser quando não temos poder sobre nossa própria identidade, e o quanto isso afeta a nossa realidade – tema recorrente em sua filmografia, por sinal, em especial Paprika. Aproveita-se, também, da cultura do próprio país, a começar pelo próprio conceito de idol, algo que simplesmente não há qualquer paralelo no Ocidente, ao menos não na atualidade.
Akira – Dir. Katsuhiro Otomo
Kiyoki: O futuro não é uma linha reta. É cheio de encruzilhadas. Deve haver um futuro que podemos escolher por nós mesmos.
Por mais que os Studio Ghibli tenham sedimentado o entendimento do Ocidente sobre animações japonesas, Akira foi o pioneiro a alcançar terras ocidentais. Sua temática pós-apocalíptica, muito em decorrência de um Japão ainda lidando com as consequências da Segunda Guerra Mundial – o filme foi lançado em 1988 – encontrou, na Guerra Fria, um momento oportuno para a sua disseminação.
Rápido, gráfico e, principalmente, violento, é um filme instigante que certamente será favorecido ao ser revisto. Ademais, o seu avanço tecnológico para a área da animação como um todo o sedimenta como um dos mais importantes de seus pares.
Túmulo de Vagalumes – Dir. Isao Takahata
Seita: 21 de Setembro, 1945…foi nessa noite que eu morri.
No mesmo ano em que Akira abria as portas para o Ocidente, Isao Takahata, um dos criadores dos famosos Studio Ghibli, traz, para a sétima arte, um dos melhores filmes sobre os males da guerra. Uma simples animação de um jovem rapaz e sua pequena irmã que, juntos, tentam sobreviver aos horrores da Segunda Guerra Mundial.
Tal qual Akira, é impossível imaginar Túmulo de Vagalumes sendo escrito e/ou dirigido em qualquer lugar que não o Japão, reforçando – como se fosse necessário – o quão intrínseco ao Cinema a cultura do seu local de produção é. Nesse sentido, poucos longa metragens conseguem causar um impacto tão profundo quanto esse.
Carioca, advogado e apaixonado por cinema. Busco compartilhar um pouco desse sentimento.