“O Operário” e o saber lidar com a culpa

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Um dos efeitos da insônia a longo prazo são as constantes alucinações, claro, isso varia de pessoa para pessoa, porém ver aquilo que não está vendo é algo frequente para aqueles malsucedidos no sono de todo dia.

Não há dúvidas de que vários outros fatores influenciam na insônia, contribuindo para uma vida ruim, e entre eles está a culpa, principalmente a culpa de ser quem você é e não se sentir nem um pouco a vontade com isso, e é desse assunto, que “O Operário”, lançado em 2004 aborda.

Dirigido por Brad Anderson e estrelado por Christian Bale, a obra acompanha Trevor Reznik, um operário comum e solitário. Morando em uma grande cidade, ele sofre de insônia e é incrivelmente magro como decorrência desta. Após um acidente que acarretou na perda do braço de um colega de trabalho, Reznik passa a não conseguir lidar com as alucinações já frequentes em sua vida.

É bacana ver como um trabalho bem feito de design de produção e de montagem podem construir um ambiente imersivo o suficiente para colocar o espectador no lugar de Reznik. E é através desses aspectos que o público colhe pistas para descobrir detalhes daquilo que está acontecendo.

O filme contem cortes nos pontos certos de cada cena, e assim é possível acompanhar tudo pelo olhar inquieto de Reznik, usando movimentos rápidos de câmera e cortes bem encaixados, percebemos como a insônia afeta a rotina tão regrada daquele aparentemente simples homem e, mais do que isso, notamos como não dormir traz consequências não apenas para ele, mas também para as poucas pessoas participantes de sua vida.

Objetos são dispostos de maneira pontual para o espectador colher material sobre a vida de Reznik, como por exemplo, um livro em cima da mesa, os posts its colados na parede e um em especial que permanece fixo durante quase todo o tempo na porta de sua geladeira. Além disso, a casa escura é um reflexo da personalidade do protagonista.

E essa iluminação escura não é utilizada somente na morada de Trevor, mas também na forma como o personagem é iluminado durante todo o filme, mesmo nas cenas externas ou nas internas com ambiente claro, o operário está sempre no ponto mais escuro, com pouca luz no rosto ou no corpo (no caso de enquadramento de corpo inteiro) e isso passa várias mensagens durante toda a obra.

Mais uma vez, Christian Bale provou como ele é perfeitamente capaz de se adaptar fisicamente a um papel, levando o seu corpo a níveis extremos com a magreza de Trevor Reznik. Essa fisicalidade serve para expor várias coisas, a culpa corrompendo um ser humano, a falta de vontade de viver, e ainda mais, é mais um dos efeitos da insônia, assim como o fato de ele ficar constantemente olhando para relógios (indicando que o tempo não passa) e de repetir todo o dia a mesma coisa, remetendo a uma fala de “Clube da Luta” (1999, dirigido por David Fincher), que diz “Com insônia nada é real. Tudo parece distante, tudo é a cópia, da cópia, da cópia”

Logo, “O Operário” é um belo filme, expondo várias coisas relevantes, tratando bem o seu público ao faze-lo deduzir os fatos e ainda temos Christian Bale em uma das grandes atuações de sua já excelente carreira.